Às vezes fico com a impressão de que a nossa justiça
recuperou os pelourinhos como forma de castigo público daqueles que os
magistrados consideram, desconfiam ou tiveram um palpite de que terão cometido
algum crime. Uma justiça que até 194 não teve qualquer credibilidade e que
desde então nunca conseguiu ter grande imagem, tenta agora exibir-se perante a
opinião pública, levando ao pelourinho personalidades caídas em desgraça.
Com jornalistas, humoristas e políticos a ignorar de forma
oportunista o princípio da presunção da inocência, os nossos magistrados levam personalidade
que o povo odeia depois de um longo período de bajulação, para sessões de exorcismo
coletivo, em pelourinhos instalados na rua, junto dos gabinetes dos juízes de
instrução.
Pouco importa se as vítimas da ida ao pelourinho vão ser
ilibados um ou dois anos depois, ou que as acusações venham a ser reduzidas a
quase nada, há que matar as saudades do povo dos espetáculos das fogueiras e
dos suplícios no pelourinho. Arranjam-se umas acusações com base em palpites,
depois de um trabalho de investigação em bases de dados conduzida por um
qualquer manga de alpaca e levam-se as novas “bruxas de Salem” ao juiz de
instrução.
Pouco importa a Constituição ou que um dos principais papeis
dos juízes de instrução seja defender dos cidadãos dois abusos dos
investigadores policiais, agora os juízes de instrução são justiceiros famosos
e como disse um advogado carimbam o que lhes diz o MP. Pior, estamos num tempo
em que alguns juízes de instrução fazem eles próprios de mandantes do
pelourinho.
Os que devem à banca que se cuidem, porque se as bases de
dados tiverem informação que com palpites criativos podem ser transformados em
acusações carimbáveis, vão parar ao pelourinho. Antes disso, o espetáculo tem
de ser montado como deve ser e terão de ser mantidos detidos e expostos ao
povo, com fugas de informação a informar a população do libelo acusatório que
justifica o suplício.
A nossa justiça está com tanta vontade de fazer justiça que
primeiro tortura e condena e só depois vai ver se acertou nos palpites a que
agora designam por “fortes indícios”.