Desde que a discussão do aumento do salário mínimo passou a ser feito com base
em aumentos em termos absolutos, com uns a propor 20€ e outros a ficarem-se
pelos 5€, que a moda pegou e agora todos os aumentos salariais no Estado ou os
aumentos de pensões é feito com base nela lógica.
Imagino que o Mário Centeno enfrenta neste momento o mesmo
dilema com que se confronta quando pede a conta num restaurante e tem de se
decidir sobre o montante da gorjeta que deve dar. Receio mesmo que se sinta na
obrigação de ser generoso porque não parece bem a um ministro dar ares de sovina,
mas quando chega ao ministério passa a ser o contrário porque um ministro das
Finanças deve ser um limão e bem azedo.
Agora querem que as pensões mínimas aumentem em 10€ e andam
em grandes discussões para decidirem se o aumento dos funcionários públicos
será de 5€ para todos ou de dez para os que ganham menos e de zero para os
outros, porque são os ricaços e já lhes é dado muito. No Estado deixaram de
haver carreiras, começa a parecer uma espécie de Havana.
Mas o mais grave é que os que assim tratam tantas dezenas de
m ilhares de cidadãos deste país revelam um conceito de respeito pela dignidade
alheia que há muito eu não via em governantes deste país. Parece que para eles
um catedrático de engenharia anda ansioso por saber se o António Costa decide
dar-lhe mais cinco euros por mês ou se tem de aguentar por um momento de
generosidade do primeiro-ministro para o próximo orçamento.
Isto é tão miserável que andam a tratar-se os funcionários públicos
como se fossem uns indigentes ansiosos por um momento de simpatia de António
Costa para poderem ganhar mais cinco euros por mês. De um momento para todos
somos todos gorjeteiros, olhamos todos com muita ansiedade para a mão do
primeiro-ministro para percebermos se ele tira uma nota de cinco euros ou se
vai ao porta-moedas e se fica por uma gorjeta de dois euros.
Enfermeiros, motoristas, engenheiros, cirurgiões que fazem transplantes de coração, catedráticos de astrofísica, economistas, comandantes de fragatas, pilotos de caças, polícias, magistrados, estamos todos em grande ansiedade porque ainda não sabemos se vamos receber uma gorjeta de cinco euros ou se vamos ter de esperar ansiosamente durante mais um ano para recebermos tão preciosa gorjeta. Já não sei o que é pior, se andar há uma década a ser desvalorizado financeiramente ou a ser cada vez mais ofendido na dignidade.