segunda-feira, novembro 06, 2006

Contra as Scut

Os argumentos em defesa das Scut são dois: a inexistência de estradas alternativas e o desenvolvimento económico das regiões servidas pelas Scut. Não me parece que o argumento da falta de alternativa seja válido e que o do desenvolvimento regional seja consistente.

O argumento da inexistência de alternativa

Se a ausência de alternativas constitui um argumento aceitável para as Scut, porque motivo as viagens de avião para as regiões autónomas são cobradas? Que se saiba alguém que se queira deslocar à Madeira ou aos Açores não tem outra hipótese senão ir de avião e nem sequer pode beneficiar de voos de baixo custo, e nem a TAP u a ANA se preocupam muito com o facto.

Poderiam ser dados dezenas de exemplos em que a inexistência de uma alternativa não determina a gratuitidade de um serviço público, e a utilização de uma auto-estrada não é outra coisa senão um serviço prestado aos cidadãos.

Se numa localidade houver uma universidade privada o Estado deve suportar os seus custos das propinas se na mesma localidade não houver uma universidade pública? Não se entende porque o princípio da alternativa serve para alguém que vai fazer turismo e já não é aplicável para um jovem que queira estudar.

O argumento da alternativa não só não é lógico como é injusto, há centenas de situações em que os cidadãos suportam custos adicionais porque são confrontados com situações em que não têm alternativas e o Estado não lhes pode inventar uma “borla”. Estas “borlas” só existem onde o Estado investe em auto-estradas ou noutras infra-estruturas, havendo muitas regiões do país que não beneficiam de quaisquer investimentos significativos. Compare-se, por exemplo, quanto custa um quilómetro de auto-estrada com o investimento que o Estado fez em infra-estruturas públicas em concelhos com São Brás de Alportel, Barrancos, Alcoutim e muitos outros.

E como se não bastasse há situações em que havendo alternativa se questiona a sua funcionalidade, como sucede com a Via do Infante, isto é, em limite o argumento da alternativa só vai deixar de colocar quando esta for tão boa como a Scut, ou seja, para que algumas Scut fossem eliminadas ter-se-ia que construir uma auto-estrada alternativa. No Algarve teríamos a EN 125 transformada em via rápida com quatro faixas e sem custos para o utilizador e então poderia ser instaladas portagens na Via do Infante que ficaria às moscas e a receita nem daria para pagar o seu funcionamento

O argumento do desenvolvimento regional

Associar o desenvolvimento regional aos custos de utilização das auto-estradas é a melhor das ilusões económicas criadas para justificar as Scut. Só não se entende porque motivo o mesmo critério não se aplica, por exemplo, ao TGV ou a todos os meios de transporte.
Não é com borlas nas auto-estradas que se promove o desenvolvimento económico das regiões, são muitos os exemplos que o demonstram, são muitas as regiões desenvolvidas servidas por auto-estradas pagas e nunca alguém se lembrou de referir as portagens como um factor de desenvolvimento.

Se o problema é a pobreza a solução para a eliminar é a concessão de ajudas directas ao rendimento, seja sob a forma de medidas sociais, como o rendimento mínimo, ou sob a forma de medidas de política agrícola para sustentar produções e fixar populações numa actividade que apesar de imprescindível não é economicamente viável. Se o problema é a competitividade da região que se invista no ensino e na formação profissional que se aposte também noutras infra-estruturas como, por exemplo, telecomunicações ou parques industriais, que se combata a burocracia e a corrupção, ou criem-se vantagens fiscais que permitam às empresas apostar nessas regiões.

A maior parte das borlas das Scut são ajudas ao rendimento de cidadãos que estão de passagem, ou mesmo às elites locais, são benefícios para empresas que não investem nessas regiões ou mesmo de empresas que pouco ganham em competitividade com esses benefícios, nada assegurando que invistam estes ganhos em competitividade.

Proposta

Portugal carece de medidas activas de desenvolvimento regional, precisa mesmo de investir fortemente nesse vector, sob pena de daqui a algumas décadas vivermos todos em três ou quatro cidades e com graves problemas ambientais resultante do abandono do interior.
Por isso há que questionar se os muitos milhões de euros que as Scut custam ao país são um bom investimento tendo em vista o desenvolvimento das regiões. Não só não o é, como cria uma situação injusta, para manter estes custos quase não sobra um tostão para investir nas outras regiões. Além disso agrava as assimetrias pois concentra todos os investimentos junto às regiões servidas pró essas auto-estradas.

Façam-se as contas a quanto custam as Scuts e compare-se com que o Estado investe noutras regiões não servidas por borlas. Se a aposta é mesmo ao desenvolvimento dessas regiões, então seria bem mais vantajoso que o equivalente às borlas fosse investido nessas regiões.