terça-feira, outubro 30, 2018

NÃO TENHA UM AVC SFF


Neste dia mundial do AVC apetece-me pedir a todos que não tenham um AVC se fazem favor, não o faço porque tenha passado por essa experiência, mas por ter convivido muito de perto e em circunstâncias muito especiais com muitas pessoas que sofreram um AVC ou que estavam em condições físicas próximas ou mais graves do que aquelas que normalmente resultam dos AVC que não conduzem à morte.

Vi grande vitórias como conseguir dar um passo, subir um degrau, subir sozinho para uma cadeira de rodas, vi muito sofrimento humano e muita dedicação por parte de fisioterapeutas, enfermeiros e médicos. Era como se estivesse num centro olímpico de alta performance, com sessões de exercícios de segunda a sábado, sem horas para visitas, sem intervalos e sem descanso. Quase isolados da sociedade, vivendo cada um com as suas limitações.

Ficamos a saber que um AVC é muito mais do que as consequências físicas, as limitações com que cada um fica. É um grande murro no estômago de muita gente que tinha uma vida saudável e socialmente intensa, que de um dia para o outro perde a mobilidade, a voz, a capacidade de deglutir e, não raras vezes, é-se abandonado pelo ou pela parceira.

Vi histórias de luta incríveis, vi jovens em cadeira de rodas, mães com duas crianças de colo, praticantes de desporto a voltar a aprender a andar, jovens e idosos que não percebiam o que lhes tinha sucedido. Conheci vidas que acabaram no isolamento, no desemprego, por vezes no abandono. Tudo isto em doentes que tinham tido um AVC há relativamente pouco tempo, que começavam uma nova vida, por vezes bem diferente daquela que alguma vez imaginaram.

Sem ter sofrido da doença junto a minha solidariedade e preocupação daqueles que comemoram este dia mundial do AVC. Até porque enquanto me recordei dos meus amigos de São Brás de Alportel trinta portugueses tiveram uma AVC e deverão estar ainda a aguardar pela chegada da ambulância. Muitos deles terão a sorte de engrossar as filas de espera dos centros de reabilitação.

segunda-feira, outubro 29, 2018

O DERROTADO FOI LULA


Independentemente do que possa dizer da eleição de Bolsonaro a verdade é que foi escolhido por uma grande maioria dos brasileiros. Não vale a pena tecer considerações sobre as motivações dos votos e muito menos acharmos que temos um estatuto intelectual que nos permite tecer considerações sobre as opções de tanta gente. Bolsonaro vai ser mais um presidente do Brasil, igual ou pior do que muitos outros a que já nos habituámos.

Mas este teve uma preciosa e inesperada ajuda, a de Lula. O grande derrotado destas eleições foi precisamente Lula, que por puro egocentrismo achou que as eleições presidenciais do Brasil deveriam ser transformadas num plebiscito à sentença judicial que o condenou à prisão. Lula não hesitou em menorizar quaisquer outros candidatos que pudessem vencer a direita, até que a última instância judicial se pronunciasse tinha que ser ele o candidato.

Ao fazer do futuro de centenas de milhões de portugueses uma causa que só a ele parecia interessar o líder do PT não hesitou em dar toda a vantagem à direita, transformando um bom candidato do PT numa figura secundária, numa espécie de suplente a que se recorreria apenas para ir a votos. Lula foi egoísta e perdeu, mas pior do que isso, conduziu todos os democratas brasileiros a uma pesada e humilhante derrota.

Como se isto não bastasse a campanha do PT parece ter sido mais para afirmação ideológica, em pleno século XXI o grande ídolo da esquerda brasileira parece ser o Che Guevara e nas manifestações do PT só faltou ver bandeiras com o Hugo Chavez. Depois da estratégia de Lula a cereja em cima do bolo da derrota anunciada foi uma má campanha, onde o único argumento a justificar o voto em Hadad era a vitória do Bolsonaro.

Bolsonar ganhou e se tiver de agradecer a vitória a alguém é ao Lula e ao seu PT.

sexta-feira, outubro 26, 2018

UM ASSALTO À PORTUGUESA



Um pilha galinhas encostou a pick-up ao buraco na rede da base de Tancos, entrou tranquilamente, abriu o portão do paiol e foi carregando a carrinha com o material que havia à mão, balas avulso, explosivos, bobinas de fios, disparadores, granadas de mão ofensivas, granadas anti-tanque, granadas foguete, cargas de corte, granadas de gás lacrimogéneo. Enfim, só não trouxe um tanque porque não conseguia passar no buraco da rede ou o ladrão não tinha carta de pesados e podia cruzar-se com alguma patrulha de trânsito.

Ainda bem que o pobre ladrão não tem bicos de papagaio, porque carregar todo aquele material entre o paiol e o carro sem poder bufar, com medo de que o ruído atraísse algum sentinela mais atento, se tivesse estaria agora ainda mais empenado do que o material que roubou. Mas depois de todo este trabalho o desgraçado deve ter pensado em ir a Tancos pedir o livro de reclamações, o material roubado que ia trazer uma vaga de atentados estava fora do prazo, estava tão estragado que em vez de explosões a Europa iria sofrer de caganeira.

E quando esperava que o pessoal acertasse as contas e esquecesse o assunto ficou em pânico quando percebeu que o seu roubo tinha merecido mais do que uma nota no meio do Correio da Manhã. O homem  entrou em pânico, mas ladrão que é ladrão tem um amigo da GNR com quem assentou praça na tropa e esse amigo é amigo do chefe da PJ militar, que por sua vez estava danadnho por ser ele a tramar a pj civil. O assalto ficou mesmo a calhar, o ladrão devolveu o material impróprio para consumo e a tropa tramava a concorrência.

Mas, não fosse o diabo tecê-las, o melhor era arranjar uma boa desculpa para evitar as consequências, se algo corresse mal tramava-se os políticos, se alguém fosse preso havia que ter um memorando bem guardadinho, a prova de que o homem de cima sabia. Isto é, se nos tramarem também estão tramados. E até parecia que a Cristas é bruxo, há meses que anda a dizer que a culpa era do ministro e do primeiro-ministro. Então não acontece que com o tal memorando de quem ninguém sabia até parece que o CDS tem um dedo que adivinha?

O problema agora é saber como é que o ilustre advogado Sá Fernandes consegue transformar os truques em argumentos que transforme o seu arguido honrado e inocente, porventura será condecorados porque tudo fez pensando estar a servir a nação.Tudo isto faz lembrar a ida do Raúl Solnado à guerra de 1908!

quinta-feira, outubro 25, 2018

A LITERATURA POLÍTICA DE CORDEL DE CAVACO SILVA


Ainda bem que Cavaco Silva faz questão de aparecer de vez em quando, há uma tendência para considerarmos que à medida que os velhinhos fiquem cada vez mais dóceis e simpáticos, imagem que é frequentemente aproveitada no marketing, como o velho anuncio dos pudins Boca Doce. Por outro lado, também é verdade que o tempo faz-nos esquecer muitas coisas, incluindo os defeitos de outros, as maldades que nos fizeram ou a forma como governaram.

Ao aparece de vez em quando Cavaco Silva ajuda-nos a impedir que nos esqueçamos da personagem, daquilo que ele foi como primeiro-ministro, do desempenho miserável que teve na Presidência da República. A raiva de Cavaco Silva que ele próprio decidiu divulgar em fascículos ajuda-nos a não o esquecer e a lembrarmos o presidente que era alvo de escutas telefónicas, que se queixava de não ter dinheiro, do investidor no BPN e de muitos outros episódios.

Mas aquele que agora diz que empurram os problemas com a barriga também foi um antigo primeiro-ministro que com a Manuela Ferreira Leite em ministra as Finanças deixou o país à beira de uma crise financeira. Já nem vale a pena comparar o actual ministro da Educação com a Dra. Ferreira Leite quando foi promovida de directora-geral do Orçamento a ministra da Educação, ainda hoje estão na nossa memória a fila de rabos de estudantes a pedir a sua demissão.

A verdade é que depois de governar dez anos a esbanjar as ajudas comunitárias este Cavaco Silva que agora dá conselhos muito sábios, deixou o Estado com os cofres vazios ao governo de Guterres. Recorde-se que desde então o seu número dois Fernando Nogueira nunca mais foi visto ao seu lado, depois de todo o país ter percebido que Cavaco tudo fez para ele perder as legislativas, convencido de que dessa forma sinistra teria mais possibilidades de ganhar as presidenciais.

Cavaco está esquecido de quando pagou parte dos vencimentos dos funcionários públicos em título dos Tesouro ou da tentativa de despedimento em massa de funcionários públicos, muitos dos quais foram nessa ocasião incluídos em listas de excedentários. Cavaco está esquecido de quando eliminou os mecanismos de protecção da agricultura portuguesa, acelerando a integração n Política Agrícola Comum, para fazer entrar os produtos agrícolas europeus a preços mais baixos, na esperança de fazer baixar a taxa de inflação. Cavaco está esquecido do mau primeiro-ministro que foi.

Ainda bem que Cavaco faz questão de vir a público recordar-nos os seu passado como político e como governante.

quinta-feira, outubro 18, 2018

NATURALMENTE RIDÍCULOS E PERIGOSOS


Confesso que não um grande admirador do Dr. Carlos Alexandre, não sei bem porquê a personagem irrita-me, nada dele me parece brilhante, as suas declarações encenadas não têm grande conteúdo que ultrapasse as fronteiras do se ego. Mas envergonha-me uma justiça onde vejo um juiz a fazer queixinhas aos jornalistas, deixando transparecer que queria um determinado processo para ele, como se só ele estivesse à sua altura.

Parece que de um momento para o outro todos são defensores do juiz natural e receio que alguém se lembre de pedir que no caso Sócrates se volte a iniciar o processo, convidando a FIFA a realizar o sorteio com bolinhas, cabendo ao Messi tapar os olhos e recolher a bolinha. Mas se o sorteio não resultar na escolha do carlos Alexandre teremos de verificar se haviam dois nomes, se as bolinhas eram rigorosamente iguais, se o vidro da tombola não tinha alguma rugosidade e se o Messi não foi trocado por algum sósia ilusionista, o que implica conferir o DNA ou mesmo os sinais na pilinha.

Tudo isto é ridículo porque enquanto o Dr. Carlos Alexandre ia construindo a sua imagem de justiceiro da Nação num Ticão em que era o único juiz, ninguém se lembrou de sorteios ou do juiz natural. Por outras palavras, enquanto o juiz era naturalmente o Dr. Carlos Alexandre ninguém se preocupou com os sorteios ou com o número de processo que o juiz natural tinha. Apesar das razões de queixas de Sócrates ninguém e muito menos a associação dos juízes veio em defesa de Sócrates, com tal arguido os bons princípios podia ir para as urtigas dos campos de Mação.

Mas quando o mesmo arguido teve direito ao sorteio para a escolha do juiz natural já surgiram dúvidas, o mesmo juiz natural de todos os processos foi o primeiro a vir com dúvidas logo aproveitadas pelos Diabos e diabretes da praça.

Esta justiça que se expõe na praça, discutindo de forma miserável os seus próprios truques, os mesmos truques que aliviam culpados e podem ajudar a tramar inocentes, é um motivo de vergonha para a democracia. Toda esta gente é naturalmente ridícula, mas também é naturalmente perigosa para a democracia e as suas instituições, a começar pela Justiça.

quarta-feira, outubro 17, 2018

AGORA QUE SOUBERAM DEU-LHES PARA CHORAR



Três imbecis chorando de riso [Expresso] que agora devem estar a chorar de gosto


Estávamos em Dezembro de 2015, para ser mais preciso era dia dois, uma quinta-feira, Mário Centeno, um ministro sem qualquer experiência política anterior, um doutorado em Harvard com uma longa carreira no Banco de Portugal, ia falar pela primeira vez na Assembleia da República. Um pobre diabo hoje promovido a catedrático, que fez uma vida à custa da política e de um emprego dado por um padrinho político montou a encenação do rir até às lágrimas.

Tudo bem montado, vale a pena reler a notícia do Expresso para vermos com alguns inúteis se fartaram de rir até às lágrimas, pensado estarem a gozar com um pacóvio sem experiência nas pulhices das jotas. Imagino que esses mesmos andem agora a chorar pelos campos pois se vivessem em Las Vegas estariam a esta hora a fazer queixas do Mário Centeno. Não sabiam na altura que o choro do riso iria dar num choro de vontade, como dizia a minha mãe quando achava que estava a fazer uma encenação.

O diabo não veio e o país teve quatro anos de estabilidade política, financeira e social, quatro anos sem o credo na boca, sem ter de aturar o Vítor Gaspar e fazer de conta que a Maria Luís era uma grande economista. Aquele de quem choraram foi um dos poucos ministros das Finanças que aguentaram uma legislatura, foi o ministro das finanças português com maior projeção internacional, foi o único economista português a a liderar uma grande instituição internacional no domínio económico e escolhido pelos seus pares pelo mérito político e económico.

Mas a esquerda portuguesa deve a Mário Centeno uma outra vitória moral bem importante, ao logo de mais de um século a direita portuguesa fez passar a ideia de que só a direita consegue equilibrar as contas públicas e que tal só é possível com algum autoritarismo. Não admira que alguns ministros das Finanças da direita tenha adotado uma “cara de pau”, sempre a imitar Salazar no elogio das origens humildes, como se a humildade ajudasse a credibilizar os tiques do autoritarismo.

Afinal é possível equilibrar o orçamento sem ser necessários recorrer à ditadura ou ao autoritarismo, sem adotar medias inconstitucionais ou, como alguém sugeriu, sem suspender a democracia durante um par de meses. É possível fazê-lo e ao mesmo tempo promover a justiça social, implementar medidas de redistribuição do rendimento e em paz social. Não há memória de um OE sem ditadura ou sem conflitos sociais e este é um legado do Centeno. É possível governar à esquerda e promover uma gestão orçamental com mais responsabilidade e competência do que a direita.

terça-feira, outubro 16, 2018

O ELEITORALISMO BOM E O ELEITORALISMO DOS VELHACOS


Andam por aí algumas virgens armadas em debutantes neste baile em que está transformado o debate político sugerindo que este OE é eleitoralista. Claro que é eleitoralista, todos os oE são elaborados a pensar em eleições e desde os tempos de Salazar e Marcelo que, felizmente, os orçamentos são eleitoralistas. Há quem prefira governos que não têm de se preocupar com a realização de eleições, mas ainda bem que esses ainda não mandam e o governo de António Costa enfrenta eleições.

Mas dizer que em Portugal um OE que prevê um défice de 0,2% não só dá vontade de rir, como são os críticos do governo que lhe estão a dar o mais poderoso dos argumentos eleitoralistas. Se um OE com aquele défice consegue margem para ter tantas medidas acusadas de eleitoralismo, então é porque o governo é mesmo bom. Dar aumentos de pensões, de vencimentos, de investimentos na saúde, de redução do custo da energia e ao mesmo tempo ter um OE é algo de muito bom, na história de Portugal deve ser considerado um milagre, desde os tempos em que acabou o ouro do Brasil que não se via nada semelhante, nem no tempo do Salazar!

Mas seria bon que estes paspalhos se lembrassem da última vez que elogiaram um governo e um orçamento elaborado a pensar em eleições, que era muita generosidade o reembolso da sobretaxa, que um défice de 3% punha a Maria Luís ao lado do Salazar no pódium dos magos das finanças. Nesse tempo cortar salários, promover despedimentos e cortar pensões eram um bom motivo para votar num governo da extrema-direita chique.

Nesse tempo essa extrema-direita chique, que agora está acoitada no Observador, não reparou que a antecipação das receitas fiscais de 2016 foi o truque usado para cumprir o défice, não sabiam que o bingo do reembolso da sobretaxa era batota eleitoral com cartas marcadas. Mas eles sabiam tão bem o que tinham montado para 2016, ano em que contavam governar e pedir um segundo resgate para poderem continuar a governar de acordo com a agenda da extrema-direita.

Quando Passos Coelho anunciou o diabo e toda a extrema-direita estava à espera que o governo caíssem sob o peso das contas públicas não falaram em OE eleitoralista, nem o OE de 2016, nem o de 2017. Agora sim, já deram pelo eleitoralismo, têm toda a razão, há um eleitoralismo bom e um eleitoralismo digno de velhacos.

domingo, outubro 14, 2018

REMODELAÇÃO POUCOCHINHA


Há muito que se percebeu que o governo de António Costa é o Centeno e mais três ou quatro, os restantes ministros não contam para nada e o seu desempenho não vale muitos votos. Todavia, há uma mania em Portugal de que o primeiro-ministro parece ser um partidários que leva a que os governos só in extremis promovam remodelações ou mesmo a substituição de um ministro caído em desgraça.

Vimos isso com  uma ministra da Administração interna e voltámos a ver agora com o ministro da Defesa. Parece óbvio que o ministro foi alvo de uma cabala de uma direita militar que parece não olhar a meios, mas na verdade há muito que a saída do ministro era evidente. António Costa poderia ter evitado um processo dolorosos, mas opotu por fazer como já tinha feito com a ex-ministra da Administração Interna, esperou até ao limite.

Também era óbvio que com a trapalhada do INFARMED o ministro da Saúde era um elo fraco do governo, a sua comunicação tem sido desastrosa, permitindo que a direita use o argumento do desinvestimento na saúde. Mas os ministros que deveriam ser remodelados não ficam por aqui, um exemplo disso é a ministra do Mar, uma ministra muito fraquinha, que se apoia num tal Apolinário que chegou a ser o escolhido por passos Coelho para presidir à Docapesca, uma empresa por onde passam alguns negócios imobiliários muito estranhos.

António Costa poderia ter ido mais longe nesta remodelação, afastando qualquer possibilidade de voltar a mexer no governo e relançando o governo para este último ano e já a pensar na próxima legislatura. Foi uma remodelação poucochinha.

quinta-feira, outubro 11, 2018

O ORÇAMENTO DAS GORJETAS


Desde que a discussão do aumento do salário mínimo passou a ser feito com base em aumentos em termos absolutos, com uns a propor 20€ e outros a ficarem-se pelos 5€, que a moda pegou e agora todos os aumentos salariais no Estado ou os aumentos de pensões é feito com base nela lógica.

Imagino que o Mário Centeno enfrenta neste momento o mesmo dilema com que se confronta quando pede a conta num restaurante e tem de se decidir sobre o montante da gorjeta que deve dar. Receio mesmo que se sinta na obrigação de ser generoso porque não parece bem a um ministro dar ares de sovina, mas quando chega ao ministério passa a ser o contrário porque um ministro das Finanças deve ser um limão e bem azedo.

Agora querem que as pensões mínimas aumentem em 10€ e andam em grandes discussões para decidirem se o aumento dos funcionários públicos será de 5€ para todos ou de dez para os que ganham menos e de zero para os outros, porque são os ricaços e já lhes é dado muito. No Estado deixaram de haver carreiras, começa a parecer uma espécie de Havana.

Mas o mais grave é que os que assim tratam tantas dezenas de m ilhares de cidadãos deste país revelam um conceito de respeito pela dignidade alheia que há muito eu não via em governantes deste país. Parece que para eles um catedrático de engenharia anda ansioso por saber se o António Costa decide dar-lhe mais cinco euros por mês ou se tem de aguentar por um momento de generosidade do primeiro-ministro para o próximo orçamento.

Isto é tão miserável que andam a tratar-se os funcionários públicos como se fossem uns indigentes ansiosos por um momento de simpatia de António Costa para poderem ganhar mais cinco euros por mês. De um momento para todos somos todos gorjeteiros, olhamos todos com muita ansiedade para a mão do primeiro-ministro para percebermos se ele tira uma nota de cinco euros ou se vai ao porta-moedas e se fica por uma gorjeta de dois euros.


Enfermeiros, motoristas, engenheiros, cirurgiões que fazem transplantes de coração, catedráticos de astrofísica, economistas, comandantes de fragatas, pilotos de caças, polícias, magistrados, estamos todos em grande ansiedade porque ainda não sabemos se vamos receber uma gorjeta de cinco euros ou se vamos ter de esperar ansiosamente durante mais um ano para recebermos tão preciosa gorjeta. Já não sei o que é pior, se andar há uma década a ser desvalorizado financeiramente ou a ser cada vez mais ofendido na dignidade.

sexta-feira, outubro 05, 2018

UM MAJOR MUITO HONRADO


Há um major do Exército que no exercício das suas funções aceitou “perdoar” a um ladrão que assaltou um paiol militar tirando proveito do roubo, trocando o encobrimento por uma suposta operação bem sucedida de uma polícia de investigação onde era um responsável ao mais alto nível. Isto é, este oficial do Exército obteve benefícios a troco de um favor criminoso e gora é apresentado por um conhecido advogado da praça como um “homem honrado”.

O oficial percebeu o que lhe poderia suceder, sem poder fugir optou por se entregar e falou que se desunhou, certamente a pensar numa estratégia de defesa há muito elaborada e isso fez de um militar sem princípios num oficial honrado, tão honrando que a sua estratégia de defesa é agora notícia no Expresso como verdade absoluta, uma verdade tão absoluta como era a recondução de Joana Marques Vidal que o mesmo jornal anunciou há duas semanas atrás.

Há aqui uma inversão de valores inaceitável, o oficial honrado, em conluio com o militar que chefiava a Polícia Judiciária Militar, aceitou que um ladrão e traficante de armamento ficasse livre para fazer outros roubos de material militar, tudo para de uma forma corrupta promoverem a sua polícia e agora são apresentados como militares honrados que tudo fizeram porque julgavam estar a fazer o que era do interesse da nação.

É preciso muita lata para vermos ilustres advogados e diretores de jornais  a defenderem uma direita militar que se dá ao luxo destas golpadas e que na hora de montarem as suas defesas são espertalhaço suficientes para tentarem envolver governantes. Os mesmos desajeitados e incompetentes que montaram uma fantochada e foram apanhados pela PJ, são agora militares muito honrados cuja estratégia de defesa assenta em verdades inquestionáveis e até o advogado ameaça tornar públicas as declarações se a honra do tal militar for posto em causa.

Nesta pantominice vergonhosa há quem acredite que estes mentirosos são agora arguidos muitos honrados e honestos.