segunda-feira, junho 16, 2008

Por uma Alta Autoridade para a Concorrência


Se pudéssemos comparar os ganhos com a corrupção com os que resultam dos abusos de mercado é muito provável que tivéssemos de chegar à conclusão de que nos preocupamos muito com a corrupção e pouco com outras formas de roubar os portugueses.

Nas pescas é evidente que o pescado chega a ser vendido abaixo dos custos de produção, nas telecomunicações as empresas acumulam lucros cobrando por uma qualidade de serviços que não prestam, o Estado cobra taxas acima dos custos, a banca brinca com os seus clientes. Se nalguns sectores é a ausência de concorrência, noutros é a concorrência a mais que promove a desregulamentação, é o caso de sectores como a camionagem ou a construção de obras públicas, onde as subempreitadas servem para desregulamentar o mercado de trabalho e promover o respeito de todas as normas, desde a lei laboral ao código da estrada.

Os mercados portugueses são uma sela onde cada um usa e abusa do poder económico para obter lucros acima do razoável e perante isto o que faz a Autoridade da Concorrência? Nada, ou quase nada, para fazer um estudo sobre o preço dos combustíveis foi necessário que o governo o encomendasse. O mesmo se pode dizer do mercado financeiro onde em casos como o do BCP a CNVM fez de espectador, ou na banca onde o Banco de Portugal está mais preocupado em assegurar que os trabalhadores portugueses são mal pagos, do que em defender os portugueses dos abusos da banca.

Nacionalizaram-se dezenas de empresas públicas com o argumento de que seriam melhor geridas e o que sucedeu? Em vez de monopólios públicos controlados pelo eleitorado, passámos a ter monopólios privados cujos administradores ganham na proporção dos lucros proporcionados aos accionistas. Pelo meio vão contratando alguns políticos caídos em desgraça, para assegurar as boas graças dos poderes.

Poder económico e poder político uniram-se para espremer os portugueses, a concorrência dos mercados é uma ficção do capitalismo à portuguesa onde o mais forte rouba o mais fraco enquanto este suporta. Veja-se o exemplo dos reboques, as mesmas companhias que não param de aumentar os prémios de seguros com os mais diversos argumentos, não actualizam a tabela dos serviços prestados pelos reboques há dez anos.

E que fazem os governos? Nada. A bem da economia, a bem da internacionalização, a bem do investimento, tudo é permitido às nossas empresas, se a lei é um empecilho altera-se a lei. Veja-se o exemplo do fisco, enquanto os pequenos accionistas estão a ser ameaçados de prisão, no caso da Operação Furacão são os magistrados que pedem aos empresários a gentileza de pagarem os elevados montantes a que se escaparem. Da próxima vez nem haverá Operação Furacão, a lei já terá sido alterada para que os nossos briosos empresários não tenham de ser incomodados.

A última pouca-vergonha legal a que assistimos é o pagamento pelos consumidores de electricidade das dívidas incobráveis à EDP. Isto é, se um cliente da EDP não paga por inércia dos seus serviços jurídicos ou por má gestão dos seus serviços de cobrança, são os consumidores cumpridores a pagar a dívida. A EDP até pode dispensar os advogados ou despedir os empregados encarregues das cobranças de dívidas, é bem mais fácil e barato aumentar a factura dos consumidores. Já pagamos tudo e mais alguma coisa, agora também vamos pagar as dívidas à EDP.

A falta de concorrência e de quaisquer regras no mercado está a matar o desenvolvimento do país e a servir para que alguns enriqueçam rapidamente e exponencialmente à custa dos outros. Para os pequenos há uma ASAE que assegura-se que metade dos restaurantes irão à falência por não terem condições de sobreviver. Os mais poderosos são têm direito aos tapetes do poder, como sucedeu com o então presidente do BCP, que depois de ter rebentado a Operação Furacão teve direito a visita de cortesia ao novo Procurador-Geral, que tinha acabado de tomar posse.