Nunca imaginei ver um ministro da Justiça em democracia vir
prestar uma homenagem pública ao ministro da justiça de um regime ditatorial,
que durante o seu mandato deu cobertura aos julgamentos dos democratas nos
tribunais plenários. Houve um tempo em que alguns governantes da direita
portuguesa tentavam recuperar algumas figuras do passado, mas nunca tiveram a
coragem de ir tão longe como foi a ministra de um governo de homens como Mário
Soares e Jorge Sampaio.,
Há tempos sentia indignação quando via gente da justiça
brasileira, uma justiça que tem muito de duvidoso, vir a Lisboa sugerir a
adoção de regimes simplificados de produção de prova e de condenação, para
dessa forma poupar no trabalho de produzir prova em tribunal. Na ocasião alguma
direita ficava excitada, pelo que nunca me passou pela cabeça que fosse uma
ministra de um governo que ajudei a eleger com o meu voto que viesse agora
sugerir tais expedientes.
Há uns tempos a justiça angolana e o seu PG fizeram gato
sapato da justiça portuguesa, no caso de corrupção envolvendo o vice-presidente
de Angola. Costa chamou-lhe um irritante e superado o irritante o caso está
esquecido. Agora é o PG de Angola que vem encomendar serviços à justiça
portuguesa e o que mais se ouve no governo é a inteira disponibilidade para
colaborar com uma justiça angolana que, em matéria de combate à corrupção, tem
dois pesos e duas medidas.
Sempre pensei que a justiça serve para condenar os culpados
e ilibar os inocentes, um princípio tão basilar que se prefere libertar um culpado
a condenar um inocente. Nunca imaginei que a caminho de meados do século XXI
uma PGR, que tem por dever defender a legalidade, desse instruções aos
procuradores para que nos julgamentos insistissem em pedidos de condenação
mesmo quando eles próprios consideram que não há matéria para condenar.
Na América o retrocesso da democracia chegou pela mão do
Trump, no Brasil pela mão do Bolsonaro e começo a achar que em Portugal chega
pela mão dos que menos seria de esperar, pelos da justiça.