sábado, maio 29, 2010

Taxar o dinheiro ocioso

Não alinho com os que tentam dizer aos portugueses que devem ser os ricos a pagar a crise no pressuposto de que todos os milhões de que ouvimos é dinheiro ocioso. Provavelmente há ricos que proporcionalmente esbanjam menos dinheiro que muitos pobres que conheço e muito do dinheiro dos ricos é capital investido em empresas, indispensável para criar emprego e gerar riqueza. Há quem num dia exija a criação de emprego e no dia seguinte proponha que se vá transformar o capital em receita fiscal para combater a crise, é como se a melhor forma do padeiro resolver a crise de tesouraria da padaria fosse vender o forno.

Isto não quer dizer que tenha alguma simpatia pelos nossos ricos, na verdade nem os tenho em grande estima e nalguns casos até os detesto. Mas não é por não gostar do Belmiro de Azevedo e por saber quantos milhões tem o dono da SONAE que vou chegar à brilhante conclusão de que se lhe aplicar um imposto extraordinário de 20% ao seu património que resolveria o problema. Talvez tivesse nessa situação, mas uns dias depois iriam devolver o dinheiro ao Belmiro e outros sob pena de terem mais umas centenas de milhares de desempregados e sem dinheiro para o subsídio de desemprego.

É evidente que a esquerda romântica que defende a apropriação colectiva dos meios de produção mas que durante cinquenta anos foram incapazes de criar um modelo económico viável, que nunca conseguiram sequer implementar um sistema de preços que substituísse os mercados em eficácia, achará o que acabo de escrever uma verdadeira heresia. A verdade é que essa esquerda foi incompetente, incapaz de acabar com a pobreza e acabou por transformar os ditos socialistas em economias de capitalismo puro e duro.

Mas se sou contra a confusão entre capital, riqueza investida no país, não tenho dúvidas de que da mesma forma que se pretende combater a baixa de produtividade ou o favorecimento da preguiça estimulada por algumas medidas do nosso “estado social” também se deve combater a ociosidade do dinheiro dos mais rico e mais ainda o seu esbanjamento em bens de luxo.

Se alguém que nada exporta, que não gera riqueza, que não cria emprego decide usar a sua riqueza na aquisição de bens de luxo importados eu nada tenho contra isso. Mas sucede que esse esbanjamento de recursos criados pelo país resultará num maior desequilíbrio externo e mais tarde ou mais cedo serei eu que nada beneficiei desses luxos a pagar a factura. Se o país não cria riqueza e usa que tem na aquisição de bens de luxo importados não tenho dúvidas de que seremos todos a pagar pelo luxo de alguns.

Discordo de muita proposta populista que sugere que sejam os ricos a pagar a crise, passando a ideia de que confunde capitais com dinheiro ocioso. Mas não aceito que o país assista impávido e sereno a fugas de dinheiro para paraísos fiscais ou que o que compra um carro utilitário para se deslocar diariamente para o emprego pague seja tão penalizado quanto aquele que compra um anel de diamantes para oferecer à amante.

Se o país quer crescer não basta falar da preguiça do trabalho, seja do trabalhador não qualificado ou do gestor, é preciso combater a ociosidade do dinheiro.