Se um grande banco privado português fosse à falência o meu "eu" ignorante abraçaria o meu "eu" de esquerda e exultaria de alegria, para além disso representar uma pequena vingança contra os que me têm sacado milhares em juros oportunistas, seria a oportunidade de ver muitos portugueses aderirem a qualquer idiotice que lhes propusesse.
Invocando o marxismo não sentiria qualquer sentimento de culpa pelas dificuldades que isso traria a muitos portugueses, senão mesmo à esmagadora maioria, a história confirmaria a minha ideologia científica e mais importante do que o mal estar que isso pudesse provocar ao povo, a abertura das portas do paraíso que tal situação traria justificaria todos os prejuízos. Eu que tinha andado décadas a propor sonhos aos que insistiam em ficar acordado seria, de repente, o salvador, as minhas soluções tão desprezadas durante anos eram agora consumidas avidamente por quem está disposto a tudo o que se pareça com uma solução.
Enquanto o meu "eu" de esquerda exultaria pela benesse recebida o meu "eu" de direita ficaria desorientado e até alinharia na crítica ao sistema e às intervenções governamentais, lembraria os tempos em que o PSD emitia comunicados em defesa do socialismo e aprovava uma Constituição à esquerda da de Chávez, para depois andar trinta anos a queixar-se do gonçalvismo.
Se um banco português, e nem é necessário que seja o BCP, ceder à crise financeira e falir a crise internacional instala-se no país e é todo o sistema financeiro que poderá ruir. Nessas circunstâncias as empresas, as famílias e o próprio Estado deixarão de ter acesso ao crédito, as empresas não exportarão, o Estado não poderá pagar a trabalhadores e fornecedores, as famílias reduzirão drasticamente o consumo. A seguir ao sistema financeiro será toda a economia a ruir. Estarão criadas as condições para Jerónimo de Sousa aparecer como candidato credível a presidente vitalício e o próprio Louça deixará de se assumir como marca branca da esquerda e afirmará a fidelidade de sempre dos seus bloquistas ao trotskismo, estalinismo e maoísmo (anterior ao revisionista a Deng Xiaoping).
Ao lado dos prejuízos que poderiam resultar da falência do BPN ou da insolvência dos accionistas do BCP as intervenções da CGD no banco dos bandidos cavaquistas ou o negócio da CIMPOR não passam de alcagoitas, se por cá o Governo nacionalizou o BPN e investiu 2.000 milhões de euros (uma boa parte dos quais será recuperável) os ingleses compraram 672 milhões de euros de títulos tóxicos, a troco de nada pois estes títulos valem tanto como as antigas acções da Torralta.
Defender que 10% das acções da CIMPOR apenas valem o que resulta das suas cotações, fixadas num momento de crise na bolsa oé ignorância ou má fé, os que criticam esta operação com base em pressupostos falsos ficaram caladinhos quando foi notícia a compra pela camarada filha de José Eduardo dos Santos da participação do BCP no BPI por valores muito acima das cotações do mercado. Será que a camarada Isabel dos Santos é estúpida ao ponto de não seguir os critérios de Francisco Louça, cujos admiradores até o elogiam pelos vastos conhecimentos em economia? A filha do presidente angolano comprou uma participação de 9,69% do capital do BPI pagando por cada acção 1,88 euros, 33,3% acima do mercado e não me recordo de ninguém lhe ter chamado estúpida, mais 3,3% do que o prémio pago na operação de compra das acções da Cimpor pela CGD. Talvez os nossos amigos preferissem que fosse a camarada Isabel a comprar as acções da CIMPOR, seria um investimento progressista...
Gosto tanto de Manuel Fino como o pessoal da extrema-esquerda, mas ao contrário dos marxistas-leninistas-trotskistas-maoistas não tenho nenhum prazer em ver os accionistas do BCP irem à falência, indo as suas acções parar às mãos da CGD ao preço da uva mijona. Isso seria o descalabro das acções do BCP no mercado, acções que já perderam quase 90% do seu valor em menos de um ano e, muito provavelmente, seria o fim do banco. Para Louçã isso seria a confirmação da sua ideologia, para mim seria o início da maior crise económica na história de Portugal, para Louçã seria um milagre, para a maioria dos portugueses seria a miséria.
A ideologia mistura-se com má-fé e Manuela Ferreira Leite, que até defendeu que a CGD deveria ser presidida e gerida por um dos seus, não resistiu à tentação do oportunismo, tal como Louça e Jerónimo de Sousa aposta na desgraça como o caminho para chegar ao poder. A oposição não tem resistido à tentação e a direita junta o seu oportunismo e má-fé à ideologia da extrema-esquerda numa cruzada contra a economia, só resta saber quem ganharia com a falência da economia portuguesa.