Gostei de ver Marques Mendes desancar nos borlistas das viagens, dizendo do alto do seu estatuto ético que não há viagens grátis. Quando o ouvi questionei-me se haverão cunhas grátis, não há muito tempo que foi notícia o seu telefonema a fazer um pedido a um dos arguidos no caso dos passaportes dourados. De repente, lembrei-me de uma personagem da telenovela "Gabriela" que está sendo exibido no canal da Globo, a dona Dorotéia também era o pilar da moral e dos bons costumes de Ilhéus, até ao momento em que se descobriu que no passado tinha sido uma "quenga" muito requisitada..
Sejamos honestos, há muito que estes passeios são norma entre altos cargos do Estado e mesmo de empresas. Aquilo que era público no setor da saúde, com os famosos congressos de medicina, era mais ou menos público noutros setores, designadamente, no das tecnologias. Desde autarcas de Lisboa a fazerem viagens em todo o terreno no deserto do Saara a quadros dos departamentos de informática a passearem nos EUA tem sido um regabofe de passeios.
É uma pena, por exemplo, que os nosso jornalistas, outro clube de Donas Dorotéias, outro dos grandes pilares da moral e dos bons costumes do nosso país, nada nos contem sobre as viagens que têm feito por conta das empresas que lhes paguem para serem simpáticos ou ficarem de bico fechado. Só à conta da EDP tem sido o ver se te avias, cada vez que a EDP dá um traque no estrangeiro lá vai uma comitiva de jornalistas fazer turismo comunicacional à grande e à francês. Sucedeu, por exemplo, quando a EDP apresentou um plano de negócios em londres ou, melhor ainda, quando, em 2015, uma numerosa comitiva de jornalistas foi a Las Vegas passear pelo deserto de Mojave e assistir ao Rock in Rio, tudo em classe executiva.
Continuando nas Dorotéias do nosso país, os tais pilares da sociedade, também ficou para a história da moralidade pública do país um famoso congresso de magistrados, realizado em Albufeira, num conhecido hotel de luxo propriedade do agora tenebroso Ricardo Salgado. Na ocasião foi notícia o luxuoso programa de entretenimento dos e das dondocas, que foram luxuosamente tratados enquanto as suas caras metades pensavam no bem da nação.
É por isso que me dá vontade de rir quando vejo o Marques Mendes ter um assomo de indignação, dizendo que não há viagens grátis. É evidente que não, as famosas viagens de Durão à conta dos seus amigos milionários, as cunhas ao pessoal do SEF, os passeios das dondocas, as visitas à tecnológica chinesa ou a uma qualquer Oracle dos EUA, as migrações dos jornalistas à conta da EDP, tudo neste país tem preço e bem mais alto do que o trabalho dos que ganham o salário mínimo.
Mais um pequeno pormenor, as viagens que agora foram realizadas antes das últimas legislativas, pequeno pormenor que faz toda a diferença no caso de queremos abordar este tema no quadro da luta político-partidária. Outro pormenor, quando comparo Marques Mendes à Dona Dorotéia não estou sugerindo que o Conselheiro comentador terá sido "quenga" ou que tem telhados de vidro, apenas evidencio a sua dimensão de mexeriqueiro oficial de Pinto Balesemão.