segunda-feira, setembro 18, 2006

BANCA: Vícios Privados, Virtudes Públicas


Agora que tanto se fala de corrupção (até houve uma manifestação de indignação porque faltaram 7.000 euros à PGR para fazer uma sondagem de opinião necessário para concluir um estudo relativo ao tema), talvez seja a altura para perguntar se não se combate a corrupção por falta de meios por inércia ou porque os grandes beneficiários têm poder suficiente para transformar o combate à corrupção num mero exercício de propaganda para “inglês ver”.

Para nos confrontarmos com situações duvidosas nem é necessário grandes investigações ou estudos de opinião conduzidos por conhecidos sociólogos, procuradores ou fiscalistas da praça, basta ler os jornais ou o relatório de actividades da IGF. Aqui ficam alguns exemplos:

No Relatório de Actividades de 2005 da IGF podemos ler:

«Inspecção às transmissões imobiliárias com renúncia à isenção de IVA - Instituição Bancária – que permitiu evidenciar que a conduta dos responsáveis da AF intervenientes em todo o procedimento de definição/informação vinculativa do regime fiscal (IVA, SISA e Selo) ligado às operações em causa e a utilização do regime fiscal pelas empresas e pelo ACE do Grupo não foi a mais adequada e regular, tendo-se proposto por estas razões, entre outras, Parecer do Centro de Estudos Fiscais sobre determinadas situações (o que já foi feito), a adopção de várias medidas em termos de actuação futura da AF nestes casos e de alteração legislativa para modificação do quadro normativo vigente. Neste sentido, por decisão do SEAF, já em 2006, e para execução da alteração legislativa prevista no art.º 45.º da Lei 60--A/2005, de 30 de Dezembro, foi constituído um grupo de trabalho multidisciplinar, integrando um representante da IGF, para efeitos de revisão dos requisitos de renúncia à isenção de IVA nas operações imobiliárias e de reformulação dos procedimentos e obrigações declarativas previstas. As correcções de imposto a efectuar nas situações já identificadas estimaram-se em cerca de 19, 8 milhões de euros.»

No Jornal de Negócios de 4 de Junho de 2004 [Link]:

«O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais deu diferimento a um pedido fiscal solicitado pelo Banco BPI, apesar dos pareceres contrários emitidos pelo mais alto responsável pela máquina fiscal, o Director-geral de Impostos, e pela directora do Centro de Estudos Fiscais. Apenas a Direcção de Serviços do IRC considerou a transmissão de prejuízos, de valor superior a 20 milhões de euros, reportada pela instituição financeira. Mas, prova de que a decisão não foi pacífica, foi o parecer do Centro de Estudos Fiscais. Apoia a decisão que acabaria por ser tomada, mas levanta sérias dúvidas quanto ao objectivo da operação e põe em causa a neutralidade fiscal.»

Ou um famoso despacho com despacho n.º 1675/2004-XV da DGCI que permitiu aos bancos que operaram fusões internas (como foi o caso do Millennium) beneficiar de uma poupança abusiva de milhões de euros em impostos sobre o património e que rezava o seguinte:

«Os prédios urbanos transferidos para a sociedade incorporante em resultado da fusão por incorporação, só deverão ser avaliados nos termos de Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, por força do disposto no n.º1 do artigo 15º do citado Decreto-Lei, quando os locatários exercerem o direito de opção de compra, nos termos dos respectivos contratos de locação.»

Três situações típicas do Serviço de Finanças do Terreiro do Paço (com subdelegação na Rua da Prata) onde em vez de se fazer cumprir a lei são alguns contribuintes que fazem a lei à medida dos seus interesses. Em Portugal há duas leis fiscais, aquela que se aplica ao cidadão comum e que obedece a todos os requisitos constitucionais e a que o Serviço de Finanças do Terreiro do Paço define caso a caso. à margem dos princípios constitucionais, e que se ajusta aos interesses da banca.Como se explicam tantos benefícios concedidos à banca?

Pois aqui fica uma sugestão: analise-se quem interveio nos processos, investigue-se quem nomeou as chefias envolvidas, veja-se quem passou pelos gabinetes do Terreiro do Paço (onde nomearam uma boa parte da actual elite dirigente do Fisco para depois irem trabalhar para a banca e vão ver o que encontram.

Ou então identifiquem os “consultores fiscais” mais bem sucedidos e estudem os seus relacionamentos, ou vão ver em que gabinetes e escritórios trabalham os dirigentes do Fisco que se aposentaram.

Outros posts d'O Jumento sobre este assunto: post 1, post 2.