sexta-feira, setembro 29, 2006

Diplomacia Pacóvia


A política externa é um dos capítulos em que um Presidente da República detém algumas competências e depois de Cavaco Silva ter invocado a sua experiência internacional durante a sua campanha eleitoral, estava com algumas expectativas em elação a esta visita ao Reino de Espanha. Apesar de ser aquilo a que se poderia designar por um país "fácil", sabia que em relação ao seu antecessor Cavaco partia em desvantagem, Jorge Sampaio tinha um à vontade e um domínio das relações humanas que a família Cavaco Silva não tem, algumas das suas intervenções no estrangeiro ficarão para a história da diplomacia, o debate em directo na CNN com o embaixador da Indonésia foi um dos pontos mais altos da diplomacia portuguesa, e foi mais barato que uma taça de champanhe.

Concluída a viagem tenho que dizer que fiquei desiludido, a actuação de Cavaco Silva deixou-me uma imagem de diplomacia pacóvia, pareceu-me uma visita de parentes pobres a quem os primos ricos da capital convidaram para passarem a Páscoa na sua casa. Foi uma viagem mal preparada, com momentos quase naif e com pressupostos errados. Foi um erro transformar uma viagem de Estado a Espanha como se fosse uma paragem extra do seu “roteiro para a Ciência” de Cavaco Silva, a não ser que quem preparou a viagem presidencial a entendesse como uma oportunidade para dar dimensão internacional a uma ideia de política para consumo interno.

Podia ter-se evitado o ridículo da oferta de um PDA com software ao rei de Espanha como se tivéssemos conseguido um grande feito tecnológico. Esperemos que os presidentes que visitem Portugal no futuro não sigam a mesma lógica, corre-se o risco de Cavaco deixar para o Museu da Presidência uma imensa colecção de electrodomésticos. Não tenho dúvidas de que para uma pequena ou média empresa portuguesa o desenvolvimento de um software é um facto positivo, mas transformá-lo em feito nacional é um exagero pacóvio.

Foi uma ingenuidade dos que prepararam a visita presidencial imaginar que uma visita presidencial a um país vizinho com o qual Portugal mantém contactos políticos quase diários poderia ter mais resultados do que o que teve. Foi ridículo ler na comunicação social que o assessores do Presidente andavam a tentar perceber se a notícia do nascimento de mais um herdeiro ao trono dava maior ou menor destaque à presença de Cavaco e o aproveitamento do facto foi mais um momento pacóvio.

A Casa Real tinha preparado a divulgação do acontecimento para depois do almoço, é natural que o comunicassem à família Cavaco Silva durante o almoço Ver a esposa de Cavaco Silva desse ares de tia-avó e a comunicação social portuguesa quase criasse dúvidas quanto à paternidade da criança foi ridículo, assim como também o foi a alegria dos assessores pelo facto de as fotografias da Rainha Sofia ao lado de Maria Cavaco Silva terem acompanhado a notícia do futuro nascimento real.

A primeira reacção quando vi a esposa de Cavaco em frente ao quadro Guernica, de Pablo Picasso, com a rainha Sofia ao lado, foi a de que alguém tinha acrescentado uma personagem à obra-prima, tão bem a senhora se tinha enquadrado para a fotografia. Só que em Espanha já se ouviram vozes contra o disparo excessivo de flashs sobre os óleos. Uma obra-prima não é propriamente um jarro de flores, para ser utilizado como enquadramento de fotografias, afinal, a sensação com que fiquei foi a de que a Espanha tem uma rainha e Portugal tem uma primeira-dona. A preocupação dos assessores em corrigir a imagem da esposa do presidente acabou para lhe dar um protagonismo para o qual não está ainda à altura.

Não tenho dúvidas de Cavaco Silva e esposa fizeram o seu melhor, caberia aos serviços da presidência fazerem melhor, começando pela forma como se relacionam com a comunicação social, foi ridículo ler nos jornais que o presidente português recebeu com antecedência uma imensa lista do protocolo, com pormenores como de que lado deveria ficar ou a quanto passos deveria andar a esposa, quase faltou dizerem-nos que os serviços da Casa Real mandou um livro de boas maneira para ensinar o presidente português a comer à mesa.

Receio que Cavaco Silva esteja rodeado de pacóvios.