terça-feira, setembro 26, 2006

Combate Total à Corrupção (1)


O maior erro que se comete nos debates cíclicos sobre a corrupção é ter a ilusão de que a sua eliminação é um exclusivo da justiça, que se elimina o fenómeno com normas do Código Penal. A experiência diz-me que não há corrupto presos e que muitas investigações serviram mais para engrandecer o currículo de procuradores (as) ambiciosos(as) e para lançar dúvidas sobre gente honesta do que para prender corruptos. Estes só têm motivos para se rir da justiça e do espalhafato que alguns fazem, principalmente quando se avizinha uma vaga de um qualquer alto cargo.

E mesmo que a justiça fosse eficaz dificilmente seria suficientemente dissuasora, uma ou duas condenações não são suficientes para assustar os milhares de corruptos que temos, e muito menos o será se estes usarem processos sofisticados ou a cobertura de uma cédula de advogados ainda se contarem com o apoio do sistema bancário.

Além disso, a corrupção está entranhada na nossa cultura, o mundo da bola está corrompido e o facto de o presidente da Liga de Clubes estar fortemente indiciado não impede um secretário de Estado de ir ter com ele uma amena cavaqueira no programa Prós e Contras da RTP1, da mesma forma que não impediu os eleitores de Gondomar de o elegerem, ou os eleitores de Oeiras de escolheram o Isaltino ou os de Felgueiras reconduziram a Fátima. São muitos os portugueses que apreciam os corruptos bem sucedidos e ainda mais os apreciam se tiverem tiques de Robim dos Bosques.

Os portugueses convivem à tanto tempo com a corrupção que não a entendem como um mal da sociedade, na sua maioria olha com inveja o enriquecimento dos corruptos e quando exigem a sua condenação trata-se mais de uma vingança invejosa do que da defesa de uma sociedade mais honesta. Toda a gente conhece casos de corrupção, todos conhecemos gente que enriqueceu de forma ilícita, e todos vivemos conformados.

A eliminação da corrupção passa pela eliminação das suas fontes e dos procedimentos que são vulneráveis e, talvez o mais importante, pela condenação social, o que pressupõe uma profunda mudança de mentalidades, mudança que não se pode ficar pelo discurso, terá de passar por uma denúncia permanente da corrupção, de quem beneficia dela, dos incompetentes que a facilitam, da burocracia que a promove, dos políticos que transigem, dos bancos que beneficiam do dinheiro, dos advogados que a camuflam com as suas cédulas.

Por isso aqui fica o apelo, se conheces casos de corrupção denuncia-os, ao longo dos posts que dedicarmos ao tema vamos contar as histórias respeitando a confidencialidade e os nomes envolvidos.

Aqui fica a primeira:

«Trabalhei durante muitos anos e, pessoalmente, só me confrontei uma vez com um caso de corrupção. Foi em 198*.
Eu trabalhava como consultor e, nessa condição, participei na elaboração de um estudo de investimento de um projecto industrial de pequena dimensão que solicitou um empréstimo ao banco ***.
O projecto, aliás, que participou num concurso do IAMEI e o banco *** mereceu a atribuição de um prémio.
Pois após vicissitudes várias, de cujo relato vou poupá-lo, embora me fosse fácil, pois ainda retenho a história do caso mas tem para aí umas cinquenta páginas, um dia o técnico que analisava o projecto entendeu embirrar com o valor que, no projecto, era proposto para exportação. Salvo erro, 5%, uma pequena parte da produção total.
Pois o indivíduo andou para trás e para a frente e não desarmava. Até que, sem saída, lhe perguntei: Mas então diga-me lá: Se 5% é muito, 4% acha bem? E 3%? E 2%? E 1%? E nada?
Responde-me o fulano: “Para lhe dizer teria de me pagar”.
Pois é, mas eu não pago. E acho que o proponente também não, respondi.
Saí. O projecto ficou definitivamente comprometido. As instalações, que haviam sido construídas com capitais próprios, são hoje garagem da Câmara Municipal local.
E eu nunca mais quis saber do fulano. E do banco *** guardo uma impressão que ainda hoje me revolta.»