O Natal é tempo de prendas e já lá vai o tempo em que as crianças metiam o sapatinho na chaminé, agora todos dão prendas a todos e os embrulhos concorrem em altura com as árvores da temporada. E num tempo em todos dão prendas as empresas também vestem a roupa de reis magos e vão dar prendas aos governantes e altos dirigentes da Administração Pública. Quem não se lembra da admiração de Guterres pelo valor das prendas que eram enviadas para o primeiro-ministro?
Nestes dias não é raro verem-se atarefados estafetas carregados de prendas a caminho dos gabinetes dos ministros, dos secretários de estado, dos directores-gerais e dos subdirectores-gerais, são sacos e sacos de artigos de luxo. Ontem cruzei-me com as prendas do BPN para a equipa governamental do ministério das Finanças. Dir-me-ão que são gestos simpáticos, que são prendas simbólicas, mas não estou a ver um banqueiro oferecer ao ministro das Finanças uma garrafa de JB ou uma caneta Inoxcrom, nem gente que até nos arredondamentos tenta ganhar dinheiro estar tão desinteressadamente generosa. E são muitos os banqueiros, financeiras, grandes empresas, etc., etc., a quem fica mal não mandar um postalzinho de Boas Festas a um ministro e nos tempos de consumimo que atravesamos um postal implica o respectivo embrulho anexo.
Quanto receberá cada ministro em prendas durante a quadra natalícia? Gostaria que um qualquer ministro, por exemplo, o ministro das Finanças publicasse a lista das prendas que recebeu, até poderia montar uma cerimónia televisionada para o vermos a carregar no botão para que essa lista ficasse disponível na Internet, à semelhança do que fez com a lista dos devedores ao fisco.
Isto não significa que duvide da honorabilidade dos ministros ou que considere que as prendas são motivos de suspeita. Só que nos países menos corruptos há muito que foram adoptadas regras quanto a prendas bem como ao seu tratamento fiscal. Até porque os muitos milhares de contos que os governantes e dirigentes recebem em prendas são deduzidos dos lucros das empresas, ou seja, são os portugueses que efectivamente as pagam, através dos impostos que pagam para compensar os impostos que deixam de ser pagos em consequência deste expediente.
Não só deveriam haver limites como as prendas deveriam ser registadas contabilisticamente com a indicação de quem as recebeu. Além disso quem as recebe deveria ficar sujeito ao pagamento de IRS sobre o valor das mesmas.
Num tempo em que tanto se fala de corrupção, de sacrifícios e de grupos de interesses seria um gesto muito saudável se Sócrates adoptasse regras neste domínio. Por uma questão de transparência, de equidade e de justiça fiscal.