sábado, janeiro 03, 2009

Que política económica para a crise?


Como já aqui disse tenho muitas dúvidas quanto à eficácia dos investimentos públicos como resposta para a crise, ainda que considere que pequenos investimentos orientados para o desenvolvimento tecnológico ou para modernizar as escolas têm um impacto mais positivo do que a construção de grandes obras públicas. Mas se o país dispunha de meios para realizar esses investimentos então não seria necessária a crise para os justificar.

A injecção de dinheiro na economia pode resultar em criação de emprego, mas não é certo que sejam os que perderam o emprego em consequência da crise a encontrarem um novo emprego. Esta criação de emprego pode ter resultados estatísticos mas o seu impacto social é reduzido, não combatendo as consequências da crise. Quantos dos desempregados do sector têxtil vão consguir emprego na construção civil ou nos investimentos na banda larga? Nenhum ou quase nenhum.

Investir em empresas em situação de crise implica que se avalie se as dificuldades sentidas por essas empresas são o resultado da crise ou o efeito combinado das consequências da crise com opções de gestão erradas. As empresas que foram mal geridas são as que agora poderão estar mais vulneráveis à crise.

O problema não está apenas na capacidade das empresas para resistirem à crise, mas sim se passado este período são suficientemente competitivas. Os últimos anos mostraram que uma boa parte do nosso tecido empresarial não é competitivo, o aumento do desemprego não foi uma novidade desta crise.

Os investimentos que estão a ser feitos para criar emprego estatístico ou para salvar empresas poderia ser muito precioso para melhorar a competitividade das nossas empresas. Veja, a título de exemplo, o investimento que já foi feito para salvar o BPN, um banco que não faz grande falta à economia.

A economia enfrenta três grandes problemas: quebra da procura externa, dificuldades no acesso ao financiamento e elevados custos de alguns serviços, designadamente, os do acesso à banca. Se em relação à procura externa pouco se pode fazer e as empresas dependem mais dos investimentos públicos feitos nos países que nos compram dos que dos investimentos decididos pelo governo, já no que se refere ao financiamento da economia ou à redução de custos podia fazer-se mais do que se fez.

Uma boa parte das necessidades de crédito por parte das empresas resulta da necessidade de financiar as suas vendas. Veja-se, por exemplo, quanto tempo leva o Estado a pagar aos seus fornecedores. Ainda recentemente o Governo prometeu pagar as dívidas do Estado, mas é bom lembrar que já em Janeiro de 2008 tinha feito a mesma promessa sem quaisquer resultados.

Por outro lado são conhecidas as situações de abuso nalguns sectores, como é o caso das grandes superfícies que usam e abusam da sua posição dominante sem que a Autoridade da Concorrência se incomode muito. Outro grande mal da economia é a pouca vergonha de muitos dos nossos empresários, mal se fala em crise generalizam-se os atrasos nos pagamentos, muitas vezes intencionais.

O Governo não só deveria impor regras quanto ao pagamento aos seus clientes, fixando taxas de juro e penalizações para os atrasos (à semelhança do que impõe, por exemplo, aos contribuintes que não pagam os impostos a tempo e horas), como deveria adoptar medidas que visem a moralização nos mercados, estimulando a concorrência. Essas medidas passam pela intervenção da adormecida Autoridade da Concorrência e por reduzir significativamente os atrasos nos tribunais cíveis.

O oportunismo não se faz sentir apenas no abuso dos prazos de pagamento, as empresas que beneficiam de situações dominantes (grandes superfícies, telecomunicações e banca) não se limitam a cobrar caro por um mau serviço, como abusam da cobrança de comissões. Veja-se por exemplo quanto cobram os bancos de comissão pelo "estudo do processo" num crédito automóvel. Mais de 700 euros, se a isso juntarmos os seguros (automóvel e vida) e as taxas de juros reais chegamos à conclusão que nas vendas de automóveis com recurso ao crédito os bancos ganham mais do que os construtores ou os revendedores de automóveis. A isto chama-se proxenetismo económico.