quinta-feira, março 17, 2011

Canudos e acções da J. Pimenta

Aquilo a que assistimos nas últimas duas décadas nas universidades privadas já vimos por mais de uma vez nas bolsas, mas enquanto no caso das acções a bolsa se encarrega de as desvalorizar, os canudos mantêm-se válidos até que os seus titulares desistam de encontrar emprego compatível com as supostas habilitações literárias. Com os canudos não se pode fazer o que Cavaco um dia fez com a bolsa, ninguém ousa dizer a verdade, que muitos desses títulos universitários não valem nada, isto é, valem tanto no mercado de trabalho como as as acções da J. Pimenta ou da Torralta valiam na bolsa.

Os anos de Cavaco foram anos de fartura, euforia e falsos sucessos e tal como a bolsa disparou também se multiplicaram as universidades privadas, criavam-se universidades privadas para sacar propinas a jovens ansiosos por serem doutores ao mesmo ritmo que se criavam falsas empresas para se lançarem opas e sacar o dinheiro aos pequenos investidores que procuravam o enriquecimento fácil. Mas se Cavaco um dia matou a sua criança do mercado bolsista ao dizer que haviam “papéis” que não tinham valor (mais teve foi um sortudo com outros papéis sem valor mas que lhe renderam bons lucros) ninguém teve a coragem de dizer o mesmo em relação a muitos diplomas de universidades privadas e até mesmo de algumas universidades públicas que multiplicaram cursos para empregar os seus professores.

Em poucos anos todos ficámos doutores, estive algum tempo fora do meu serviço e quando regressei já não havia dactilógrafas e as administrativas tinham desaparecido, já eram todas doutoras e hoje já não é raro ver o título de mestre nas portas. Há doutores e mestres para todos os gostos, desde a licenciatura em violoncelo ao mestrado em educação de infâncias, um dia destes vamos ao infantário buscar a criança de quatro anos e alguém nos avisa que a sua educadora é catedrática de educação de infância e a auxiliar é licenciada.

Compreende-se o silêncio colectivo, muitos dos que controlas a comunicação social, jornalistas e comentadores, beneficiaram e continuam a beneficiar com o negócio, ajeitam os seus rendimentos com os falsos cursos que iludem uma boa parte dos que não conseguiram entrar nas universidade públicas. Há dezenas de cursos de comunicação social, de direito e das mais diversas ciências para cujo ensino basta uma sala, cadeiras e um quadro. Uma boa parte dos nossos jornalistas, comentadores e políticos fazem uma perninha nessas falsas universidades, até o líder da oposição disse que não aderia à greve geral porque tinha que dar aulas, licenciado numa dessas universidades privadas está-se mesmo a ver que deve estar a ministrar uma cadeira no mestrado do MIT! E já quase estamos esquecidos de quando o Paulo Portas andava num Jaguar pago pela Amostra, uma empresa de sondagens que pertenciam à grande Universidade Moderna, uma universidade que albergou muito político honesto que por aí anda.

Hoje há universidades, pólos universitários, centros universitários, institutos universitários por tudo quanto é canto, vamos a uma praia e damos com um pólo universitário, visitamos uma aldeia remota, daquelas que dizem estar abandonadas, e damos com uma seta a indicar onde fica a extensão universitária de um qualquer instituto. Multiplicam-se cursos para tudo e mais alguma coisa, principalmente de coisas como comunicação, relações públicas, relações humanas, relações internacionais, ciência política e outras artes indispensáveis ao nosso desenvolvimento. Temos mais cientistas políticos do que a NASA tem engenheiros e se damos um pontapé numa pedra saltam dez jornalistas, cinco gestores de marketing, vinte licenciados em direito, três gestores de relações públicas e mais uns quantos especialistas das mais diversas matérias.

O problema agora é saber quem vai explicar a um jovem com trinta anos que foi ludibriado que os seu canudo vale tanto com as acções da J. Pimenta e que o melhor é inscrever-se num curso profissional de jardineiro ou de electricista no Instituto de Emprego e Formação Profissional. Certamente não vão ser os jornalistas ou os políticos que durante anos foram proxenetas desta mentira colectiva que tomarão posição, muito desses andam anda agora muito empenhados em apoiar as manifestações da geração que ajudaram a estar à rasca.