segunda-feira, março 14, 2011

E depois da crise?

Deixem-me adivinhar, se por mero acaso esta crise for superada o que sucederá depois?

Se Sócrates ainda governar, o que é bem menos provável do que ele superar a crise, dirá que pela segunda vez conseguiu meter as contas em ordem, investirá mais uns milhões em energias renováveis, retomará a construção de mais umas quantas auto-estradas à borla, construirá o aeroporto de Alcochete, alargará a rede do TGV e sobreviveremos alegremente até à próxima situação adversa. Entretanto, Cavaco já terá feito as pazes com Sócrates depois de este lhe garantir que o convidaria para algumas inaugurações e abriria os cordões à bolsa para aumentar o orçamento da Presidência da República, comprometendo-se ainda a adoptar medidas para o ressarcir da perda do vencimento de presidente e do corte nas suas pensões em resultado do PEC IV.

Nessa altura Teixeira dos Santos fará previsões optimistas da execução orçamental, Sócrates assegurará que graças ao seus sucesso anterior na consolidação das contas públicas não será necessário recorrer a medidas de austeridade pois as previsões estão em linha com as metas estabelecidas. Quando tivermos distraídos damos com Teixeira dos Santos a convocar uma conferência de imprensa para informar os portugueses que é mesmo necessário fazer a última coisa que ele desejava, cortar vencimentos e aumentar impostos. Entretanto Sócrates vai a caminho de um Conselho Europeu onde divulgará as medidas que corajosamente adoptou sem consultar ninguém pois no seu país de analfabrutos só ele e o Teixeira é que sabem como resolver a crise que surpreendeu o país.

Se Passos Coelho governar, que não é muito provável e seria um desgosto para Cavaco Silva, a primeira medida que tomará visa devolver a Cavaco Silva tudo o que ele perdeu com todos os PEC adoptados por Sócrates e dirá que tal só foi possível porque enquanto líder da oposição obrigou Sócrates a adoptar todas as medidas que foram necessárias. Assegurará que o fez com muito sacrifício mas que com tantos líderes internacionais a telefonar-lhe pedindo o seu apoio não podia deixar de ser um político responsável e apoiar medidas de que discordou.

Defenderá que o país já tem dinheiro para retomar a rota do crescimento e que as grandes obras públicas serão necessárias para promover o emprego e a modernização do país, promoverá a construção de auto-estradas que serão à borla depois de ouvidos os anseios dos seus autarcas, retomará a construção do aeroporto de Lisboa depois de ler previsões que asseguram que o de Lisboa está saturado, retomará o projecto inicial da rede do TGV tal como o governo de Durão Barroso decidiu.

Quando os portugueses forem surpreendidos por mais uma crise financeira dirá que ao contrário de todos os males que tinham sucedido ao país no passado a culpa já não pode ser atribuída a Vasco Gonçalves, agora o culpado é Sócrates que nunca ouviu as suas propostas quando era líder da oposição e que assumiu os compromissos com as empresas de obras públicas para prosseguir as auto-estradas, o aeroporto e os TGV. Muito pesarosamente e com ar choramingão dirigir-se-á aos portugueses para os informar que depois de ouvido o governador do Banco de Portugal, a chanceler Merkel e o Durão Barroso não lhe resta outra alternativa senão adoptar as medidas de que sempre discordou, cortes nos vencimentos, despedimento de funcionários públicos e liberalização da legislação laboral.

Depois desta crise virá mais outra crise porque o que se passa no país não se explica apenas por factores externos, a incompetência da classe política, o oportunismo dos dirigentes partidários, a imensa teia de interesses que gere o poder e os abusos de uma burguesia política instalada conduzirão o país a sucessivas crises.

E um dia em vez de serem apenas alguns jovens enrascados porque tiraram licenciaturas inúteis e mais uns entradotes que estão à rasca com bicos de papagaios será todo um povo à rasca a vir para a rua e dizer basta.