sábado, abril 12, 2008

A democracia representativa à portuguesa


Não entendo o ruído que por aí vai por causa da ida de Jorge Coelho para a presidência da Mota-Engil, num país onde todos praticam a regra de que “quem parte ou reparte e não fica com a melhor parte ou é estúpido ou não tem arte” o ex-ministro do PS mais não fez do que ser como todos os outros portugueses. Como era de esperar e ele próprio disse o que os que o criticam sentem é inveja, isto é, dor de corno.

Mais do que críticas motivadas por problemas ortopédicos na zona do cotovelo, o sacrifício pessoal de Jorge Coelho, que decidiu ganhar em função da contas de lucros e perdas de uma empresa em vez de desempenhar cargos públicos, merece o elogio de todos. Num tempo em que tanto se insinua que a democracia está a ficar doente, ou pelo menos com alguns achaques, Jorge Coelho decidiu dar o seu contributo individual para o aprofundamento da nossa democracia representativa, uma das mais evoluídas e capazes de responder aos desafios da globalização.

A globalização requer formas evoluídas de democracia representativa, as comissões de trabalhadores, de idosos, de mulheres, de jovens ou de moradores são formas arcaicas e ultrapassadas, incapazes de dar resposta adequada aos desafios da competitividade. O mesmo se pode dizer de hemiciclos parlamentares fechados e isolados da realidade, onde políticos vão sendo alimentados para serem mugidos sob a forma de produção legislativa.

A presidência de uma grande empresa familiar de obras públicas por um político de grande notoriedade significa que a nossa estrutura empresarial evoluiu com a democracia para novos modelos de gestão e de representatividade política. Os políticos passam a dirigir empresas ao mesmo tempo que as empresas se fazem representar nos gabinetes ministeriais. Longe vão os tempos dos políticos mais remunerados, tornando a nossa democracia dependente dos menos capazes.

Ao mesmo tempo a democracia deixa de depender em exclusivo de partidos organizados em torno dos orçamentos autárquicos, as empresas são capazes de viabilizar economicamente os nossos partidos, o PSI20 tem mais deputados do que o parlamento, a banca tem ministros das Finanças que davam para assegurar as aulas de Harvard ou do MIT, as empresas de obras públicas têm tantos políticos que os que estão no activo até se retiram para dar lugar ao LNEC.

O caso Jorge Coelho é um símbolo da chegada das empresas à democracia representativa, se os idosos e reformados, os jovens, os gays, os moradores ou os trabalhadores se organizam em estruturas paralelas de democracia representativa, porque razão não haveriam as empresas de o fazer? E que melhor maneira de o fazerem senão recolocando no activo políticos parta quem a democracia parlamentar se tornou pequena.