segunda-feira, junho 01, 2009

A proletarização (forçada) dos funcionários públicos

Uma das consequências mais perversas da “modernização” da Administração Pública foi a proletarização forçada da generalidade dos funcionários públicos, ficaram de fora alguns grupos profissionais, como os polícias, os militares e os magistrados que não gostam de ser considerados funcionários públicos. Nem mesmo grupos fundamentais para o Estado, como é o caso dos funcionários do fisco, ficaram de fora daquelas que numa visão ultrapassada foram consideradas funções de soberania do Estado.

Esta proletarização forçada e apressada assentou em dois princípios: na desvalorização intelectual e profissional da generalidade dos funcionários através de um sistema de quotas de avaliação em que a esmagadora maioria são considerados à partida fracos profissionais; na adopção das regras do sector privado naquilo que este sector tem de pior.

Os funcionários públicos passaram a ser trabalhadores precários e com o fim da Inspecção-Geral da Administração Pública, nem têm direito a uma inspecção do trabalho, essas competências terão ido parar à IGF, que não passa de uma semi-secreta ao serviço do ministro das Finanças. Tanto quanto sei ainda não produziu qualquer relatório sobre as condições de trabalho dos funcionários, mas já violou a correspondência electrónica de todos os funcionários do fisco numa tentativa ridícula e pidesca de caçar fantasmas, provavelmente o autor de algum blogue que incomoda os amigos.

Esta desvalorização dos funcionários não deixará de ter consequências perversas para o próprio Estado. O actual modelo não estimula a qualificação, favorece a subserviência, a longo prazo tornará o Estado num deserto de técnicos qualificados já que não tendo nada para oferecer aos mais capazes a não ser uma classificação humilhante na avaliação do desempenho os mais capazes sentir-se-ão mais atraídos pelo sector privado.

Esta desqualificação da Função Pública está em contradição com as exigências crescentes que se colocam à Administração Pública. Serão funcionários mal pagos e maltratados que terão de gerir um sistema fiscal cada vez mais complexo, avaliar projectos de investimento gigantescos, estudar a viabilidade de grandes projectos energéticos, produzir toda a legislação do Estado.

Já é possível antecipar o que vai suceder, basta ver quanto gasta o Estado a consultores externos para produzirem estudos que no passado recente eram feitos a custo zero no Estado.

Quando a actual geração de funcionários se aposentar ficaremos com um Estado muito mais fraco, com funcionários mais expostos às decisões políticas e mais permeáveis à corrupção. A suposta modernização da Administração Pública começou precisamente por destruir o que o Estado tinha de melhor, a alta qualificação dos seus quadros. No futuro só um doido é que aposta numa carreira do Estado, até porque a promoção de idiotas a funções de chefia que os partidos do poder têm promovido ao longo da última década está a tornar o Estado num local psicologicamente pouco saudável para trabalhar.

PS: O autor desta brilhante reforma já mudou de funções, resguardou-se num cargo que não só lhe garante um vínculo vitalício como lhe proporciona um estatuto de sacerdote com direito a subsídio de renda livre de impostos. Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é estúpido ou não tem arte.