segunda-feira, junho 15, 2009

Suspender obras públicas?

Desde sempre me manifestei contra um modelo económico alimentado por obras públicas ainda que dificilmente a economia portuguesa gerará o emprego necessário sem recorrer a elas, para além de algumas das grandes obras serem indispensáveis. Portugal sempre teve excedentes de mão-de-obra, no passado foram absorvidos pelas ex-colónias e fundamentalmente pela emigração, mais recentemente, como Cavaco em primeiro-ministro, esta realidade foi disfarçada com as obras públicas.

Mudar este modelo é uma tarefa de décadas e passa pela qualificação profissional, pelo investimento em novas tecnologias e principalmente por aumentar a competitividade externa e diversificação das exportações. Infelizmente para a economia não há o equivalente à metadona ministrada aos toxicodependentes, a suspensão das obras públicas como muitos defendem pode ter consequências desastrosas. Para muitas empresas essa suspensão pode significar menos peso do Estado a médio prazo, mas significa também o emagrecimento do mercado interno e as consequentes dificuldades para muitas. É bom lembrar que o dinheiro investido em obras públicas não desaparece, alimenta o circuito económico estimulando a procura.

Todavia, duvido da honestidade de alguns políticos, começando por aqueles que no passado fizeram carreiras políticas à custa dos investimentos públicos, chegando mesmo a transformar as suas agendas políticas em sucessivas cerimónias de inaugurações. Tenho muitas dúvidas de que os políticos estejam a abordar este problema numa perspectiva económica, estarão mais interessados em obter ganhos políticos (e outros menos lícitos) do que preocupados com o endividamento externo.

Se o Governo (este ou qualquer outro) decidisse de um momento para o outro a suspensão de todo ou parte substancial do programa de obras públicas isso teria efeitos imediatos na actividade económica, muitas empresas decidiram reequacionar os seus investimentos e daí resultaria um efeito em cadeia. Se a economia é “viciada” em obras públicas serão inevitáveis os efeitos da síndrome de abstinência.

Tenho muitas dúvidas sobre a posição do PSD em relação a obras públicas cuja concretização decidiu enquanto foi Governo e agora propõe que sejam sujeitas, poderei estar muito enganado mas estou convencido de que se o PSD chegar ao poder depressa encontrará argumentos brilhantes para inverter a decisão e promover essas mesmas obras, nem sequer me admiraria se nesse cenário Cavaco Silva decidisse cumprir finalmente a sua promessa de ajudar o Governo com os seus vastos conhecimentos e encontrasse argumentos para justificar essa inversão de posição.

A posição do PSD pode ser sustentável de um ponto de vista económico ainda que nunca o tenha feito, já defendeu a suspensão dos projectos por não haver dinheiro (quando Ferreira Leite chegou à liderança), depois justificou essa posição com a necessidade de distribuir o dinheiro pelos pobres (no congresso do PSD), com a crise financeira o argumento usado foi a dificuldade de aceder ao crédito (argumento de que já se esqueceu) e mais recentemente Manuela Ferreira Leite parece ter concertado argumentos com Cavaco Silva e justifica a suspensão do programa de investimentos com o endividamento externo. Pelo meio ainda abandonou a exigência de suspender as obras na condição de não serem decididas apenas pelo PS.

Os argumentos são tantos que duvido da sua sinceridade, para além de alguns dos que foram usados não terem o mais pequeno fundamento. É por isso que desconfio que o PSD esteja mais preocupado com o seus próprio interesse do que com o do país quando defende o fim das grandes obras públicas. Com tal decisão agravaria as expectativas dos agentes económicos e provocaria um adiamento da recuperação económica o que em termos eleitorais traria benefícios. Por outro lado o adiamento das obras permitira ao PSD partilhar o imenso mercado dos financiamentos ilegais, sendo bom recordar que uma parte da campanha eleitoral que levou Manuela Ferreira Leite a ministra das Finanças foi financiada pela Somague, e só vimos a ponta do iceberg. Talvez seja por isso que num momento de lucidez oportunista Manuela Ferreira Leite defendeu que enquanto líder do maior partido da oposição deveria participar nestas decisões.

O país não pode estar sujeito às ambições de curto prazo de Manuela Ferreira Leite e dos cavaquistas, estas decisões merecem ser tratadas de forma séria. Se o problema é o endividamento externo então Manuela Ferreira leite não deve defender apenas a suspensão das obras, deve propor um calendário para esse adiamento, comprometendo-se com o país a não apoiar a sua realização num prazo suficientemente longo pois o endividamento é problema para superar numa década.

Se Manuela Ferreira Leite se comprometer a apoiar uma moratória dos grandes projectos por um prazo de dez anos e acordar num limite financeiro aos investimentos estatais em obras públicas, independentemente da sua dimensão ou de serem promovidos pela Administração Pública Central ou Local estarei disponível para aceitar a sua proposta.

A única condição que coloco para o fazer é que Manuela Ferreira Leite explique ao país como vai criar emprego para o excedente crónico de mão-de-obra, agravado pela contínua decadência do sector primário, para além de compensar o aumento de desemprego resultante do processo de deslocalização de muitas empresas que abandonaram o país e pela redução da procura interna e externa provocada pela crise financeira. Até ao momento Manuela ferreira Leite ou nada propôs ou limitou-se aos argumentos “da treta”, não basta recorrer a evasivas como afirmar que são as pequenas e médias empresas que criam emprego.

Estamos a falar do emprego de dezenas de milhares de portugueses ou da meia dúzia de boys do PSD que apoiam Manuela Ferreira Leite? Se a líder do PSD se limita a propor a suspensão das obras sem apontar uma solução para as consequências dessas suspensão terei de concluir que para que o PSD possa ganhar umas comissões por fora e empregar meia dúzia de boys, muitos portugueses serão condenados ao desemprego e à emigração e muitas empresas terão de marcar passo durante mais uma década.