Quando se fala da crise financeira invoca-se o ‘subprime’, esquece-se que esta economia da mentira é anterior à actual crise financeira, começou muito antes com o caso Enron. A mentira generalizou-se aos mercados instalando a desconfiança dos investidores, as empresas mentem para enganar o fisco, os gestores mentem para enganar os accionistas, as empresas públicas mentem para enganar os ministros, os governantes mentem para enganar os eleitores, os estados mentem para enganar os parceiros com que assumiram acordos.
O respeito dos compromissos assumidos no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento criou na Europa uma cultura de mentira, cultura que tem sido alimentada por uma infinidade de truques contabilísticos que visam disfarçar ou mesmo esconder os défices e as dívidas públicas, e o mais grave é que todos estes truques foram validados pela Comissão Europeia. Os estados europeus enganaram-se a si próprios ao terem disfarçado os seus abusos orçamentais atrás de aldrabices contabilísticos, isso sucedeu desde o inicio, foi assim que uma boa parte deles cumpriram as exigências para aderir à moeda única.
Os próprios défices excessivos resultantes da crise financeira cujo combate os mais ricos exigem aos menos ricos foram aceites pela União Europeia, nessa altura interessava aos países mais ricos que a procura dos seus produtos não abrandasse. Agora que o risco vem dos mercados financeiros os países mais ricos receiam as consequência da dívida pública e exigem que sejam os mais fracos a acalmar os mercados.
O medo da Europa não é que Portugal ou Espanha deixem de cumprir com os seus compromissos, é que os receios dos investidores alastrem e em vez de contabilizarem as dívidas dos países do sul decidam fazê-lo em relação a toda a zona do Euro e em vez de considerarem as dívidas dissimuladas pela aldrabices contabilísticas determinem a sua dimensão real. Quando isso suceder a Europa entrará em crise, é por isso que os países do sul são sacrificados para segurança dos mais poderosos.
Não percebo como muitos dos nossos ilustres economistas se limitam a olhar para o umbigo e a insistir na culpa do governo, não só ignoram a crise internacional e as pressões especulativas, como fazem de conta que nada se passa à nossa volta. É evidente que a cobardia tem aqui uma grande utilidade política. Primeiro ignoraram a crise internacional quando esta invadiu a economia portuguesa como se fosse um tsunami exigiram medidas de apoio social e investimento, agora que a dívida cresceu alinham com todos os fundamentalistas externos e propõem medidas que equilibrem as contas e derrubem o governo a tempo de serem outros a beneficiar eleitoralmente da recuperação económica.