É evidente que esta situação interessa a muita gente, os juízes têm mais poder quando nada decidem do que teriam se decidissem com celeridade, os advogados tornaram-se num autêntico clero dos tempos de hoje, parecem abades abastados enriquecidos com o dízimo que o país lhes reserva, até o pessoal da justiça tem o estatuto de classe média alta da Administração Pública, com alcavalas e benefícios de saúde próprios graças às chorudas custas judiciais que os portugueses são obrigados a pagar. Aliás, ninguém entende porque razão se protesta tanto pelo pagamento de uma taxa aplicada numa cirurgia que custa uma fortuna ao Estado e faz-se silêncio quando se aumentam as custas judiciais ao nível do absurdo.
Um dos lados mais ridículos da aberração a que chamamos justiça é a forma como os próprios políticos, incluindo o mais alto magistrado da Nação, a ela recorrem com propósitos políticos. Veja-se o caso da recente lei do casamento gay, Cavaco Silva que não estava interessado em promulgar uma lei que ia contra as suas convicções pessoais, mas também não queria ser ele a vetá-la porque isso iria contra os seus objectivos eleitorais, recorreu ao dinheiro dos contribuintes para pagar um douto parecer ao professor Freitas do Amaral em apoio do envio do diploma ao Tribunal constitucional com dúvidas sobre todos os artigos menos aquele que parecia mais polémico. Quando um Presidente da República usa dinheiro para pagar pareceres que apoiem as suas opiniões e recorre ao Tribunal Constitucional para que seja este a “vetar” uma lei que ele não deseja vetar para não perder votos nas próximas presidenciais, está tudo dito sobre a nossa justiça.
Em nenhum país europeu se recorre tanto ao Tribunal Constitucional, só cá é que parece existir uma Constituição que alguns insistem em que serve para estabelecer o paraíso por decreto e tudo o que vá de contra os interesses ou ideologias de alguns deve ser inconstitucional. Se Cavaco recorreu ao Tribunal Constitucional em defesa dos bons costumes, são agora os sindicatos que querem impedir o governo de combater a crise invocando a inconstitucionalidade.
E o país está com sorte porque os sindicatos não descobriram nas medidas agora adoptadas um qualquer argumento que pudesse viabilizar uma providência cautelar, se assim fosse não seria difícil encontrar numa qualquer comarca desconhecida um juiz amigo que despachasse no sentido de impedir o governo de adoptar quaisquer medidas, não seria nada que já não tivesse sucedido nos últimos tempos, em que tudo fica por fazer graças a providêencias cautelares.
Não admira que os magistrados tendam a chamar a si um papel na sociedade que não teriam se a justiça funcionasse, é um pouco o que sucede com as calamidades pois quando Deus decide esquecer-nos e provocar um terramoto ou um tsunami que os padres se tornam importantes para o povo. É por isso que os magistrados têm chamado a si o estatuto de sacerdotes que se afirmarem enganosamente acima da vida política tendem a querer decidir a política do país. Fazem-no da pior forma, bloqueando o país e eliminando a classe política e condicionando as opções eleitorais dos portugueses. Tal como são os padres que dizem o que é pecado são os juízes que acham a si o papel de dizer quais são os políticos pecaminosos.
Em Portugal já não há justiça a não ser para aquilo que é essencial, para prender, o pilha galinhas, o pequeno traficante ou o homicida, para tudo o resto o que temos é uma classe de gente abastada que descobriu que pode enriquecer à custa do país e que não ousa em destruí-lo em defesa dos seus interesses.