Cavaco Silva tem sido uma sombra ao lado da imagem de competência deixada pelos seus antecessores, tem cumprido um mandato pessoal a pensar mais em si do que no país, chegado à Presidência optou por assumir o papel de recandidato presidencial, usando os poderes, as relações com a comunicação social e a agenda presidencial em função da sua imagem. Chegou mesmo a ultrapassar o aceitável com as suspeitas das escutas em Belém.
Cavaco afirma-se como um político de valores mas não hesita em esquecer os seus valores como o fez com a promulgação do casamento gay. Num dia junta a família, põe uma gravata azul nos netinhos e recebe o Papa no Palácio de Belém como se este fosse o palácio real e o genro o Príncipe de Boliqueime, no dia seguinte faz uma comunicação esfarrapada para tentar dizer que não valia a pena defender os seus valores. É um candidato presidencial para quem os votos são demasiado importantes para que possam ser perdidos em quaisquer circunstâncias.
Em vez de estabilidade tem promovido a instabilidade, em vez de apoio estratégico ao governo usa-o em função das sondagens, quando o governo está em alta publicita as suas reformas nas suas visitas ao estrangeiro, quando o governo está em baixa prefere as estradas municipais às auto-estradas. Quando o país mais precisava de um Presidente à altura dos desafios temos um político calculista a pensar na sua imagem, algo que não se compreende num político que já não tem idade (e duvido que tenha saúde) para pensar em termos de futuro. Cavaco ficará na história de Portugal como o primeiro-ministro das oportunidades perdidas e como um presidente que prometeu dar ao país mas acabou por gerir o mandato de forma a receber.
A esquerda, vítima de vaidades e de golpes de políticos matreiros, foi incapaz de propor um candidato à altura, cada partido arrasta-se em escolher um candidato faz de conta ou apoiar um Alegre com cara de quem está a engolir areia. Restava ao país um candidato à direita já que Alegre teve o cuidado de secar qualquer hipótese de candidatura à esquerda e mesmo ao centro.
Mas os PSD cavaquista insiste em impedir o seu funeral, mesmo que já tenha morrido há uma década e depois de ter percebido que não ressuscitaria como se viu com a derrota de Manuela Ferreira Leite nas legislativas, bem como com a derrota de Paulo Rangel nas directas. Se Pedro Passos Coelho tivesse a coragem de promover a rotura com os fantasmas de um PSD cavaquista que enriqueceu, engordou e já entrou na fase da senilidade ganharia as presidenciais contra Alegre e teria o caminho aberto para as legislativas.
Mas tal como Cavaco não teve coragem política para vetar uma lei que detesta e vai contra todos os seus princípios, Pedro Passos Coelho não teve a coragem de enfrentar o PSD cavaquista e dar ao país um Presidente da República com futuro. É uma pena que assim seja, nem o PSD vai ganhar com uma vitória de Cavaco Silva, nem o PS ganhará com uma derrota de Alegre e será o país que mais perderá com um presidente que não merece sê-lo e, pior do que isso, já mostrou que não tem dimensão para o ser.