Este desprezo governamental pelo cidadão comum para privilegiar os grandes agregados a favor das grandes empresas tem como consequência um crescente dualismo na economia e na sociedade. Se é evidente que o nosso modelo económico gera um profundo dualismo económico, o desprezo das elites políticas por aqueles que não têm representantes nos corredores do poder gera um dualismo social em que se torna evidente que há portugueses de primeira e portugueses de segunda.
Para uns há ajudas estatais ao investimento, benefícios fiscais, ajudas dos mais diversos tipos, muitas vezes para promover investimento que dois ou três anos depois se deslocalizam com armas e bagagem para outras paragens. Para os outros há uma via sacra de burocracia, batalhões de polícias para inspeccionar tudo, desde o ninja da ASAE ao fiscal dos impostos. Há claramente uma atitude de desprezo para uns e quase subserviência para os outros.
É uma pena, pois as milhares de pequenas iniciativas locais de emprego que se perdem significam dezenas de milhares de empregos que não se criam. Empregos indispensáveis para assegurar a estabilidade do tecido social, para manter a população no interior, para assegurar o equilíbrio ecológico e para dar vida ao mundo rural. Se o dinheiro de um único grande projecto fosse aplicado na promoção de iniciativas locais de emprego ou no financiamento do micro-crédito criar-se-ia mais emprego do que o que resulta da formação de imensos batalhões de serventes de pedreiros mobilizados na emigração que alimentam as grandes obras.
Mas os nossos políticos estão mais interessados nos investimentos dos Belmiros, no sucesso dos banqueiros, nos lucros das telecomunicações, esses sim são o motivo das suas preocupações, os destinatários de uma boa parte dos dinheiros públicos. Cada vez menos as políticas governamentais são destinadas a todos e o grande investimento nas políticas sociais de que tanto se fala não é mais do que a consolidação do dualimso económico e social. Os governos já não combatem as desigualdades, assumem-nas e adoptam políticas a pensar nos ricos e políticas a pensar nos pobres.