Sobre a notícia do ‘i’
Esgotadas as gravações de processos judiciais parece que os jornais se voltam para questões menores para manterem as vendas em alta, a notícia do ‘i’ vale pela chamada na primeira página que não passa de um mero acto de delação. O jornalista Paulo Pinto Mascarenhas (jornalista e co-autor do blogue “31 da Armada”) resolveu um dos grandes mistérios da blogosfera portuguesa e correu a avisar a Interpol.
Este é mais um sinal do que por aí se vai passando, o jornalismo deixou de ser independente em relação às polícias, promove julgamentos na praça pública e agora são os jornalistas que tentam ajudar as polícias na procura dos “criminosos”. Deixaram de questionar as verdades oficiais, limitam-se a digerir a “comida” dos enlatados de escutas e peças processuais substituindo-se aos tribunais, condenando tudo e todos muito antes de qualquer julgamento.
Nos últimos tempos a direita jornalística, ajudada por alguma esquerda conservadora, tem vindo a tentar passar a ideia de que as últimas eleições legislativas foi um golpe de estado, alguém descobriu que um blogue (SIMplex) com três ou quatro mil visitantes teve um papel determinante no resultado eleitoral, pelo que a mera participação nesse blogue é motivo de suspeita, todos os que nele escreveram, excepto um dos membro que traiu a confiança dos amigos e passou cópias de emails pessoais à comunicação social, são presumíveis criminosos. Apenas os delatores são boa gente.
Parece que o que desencadeou esta preocupação com a identidade do autor d’O Jumento resulta da sua participação no SIMplex o que me leva a crer que quem tenha tomado posições políticas públicas pode agora ser perseguido e alvo de vinganças em resposta a esse exercício de um direito de cidadania.
Como o jornalismo está a ser alimentado pela devassa da vida privada, pelo regresso ao tempo da bufaria e pela traição dos amigos fico agora à espera que Paulo Pinto Mascarenhas use o ‘i’ para denunciar os seus colegas do blogue “31 da Armada” que assaltaram a Câmara Municipal de Lisboa e roubaram a bandeira nacional, até pode ser que algum colunista do mesmo ‘i’ tenha trocado mais com os perigosos criminosos e os use para o ajudar a identificá-los. Infelizmente não sei quem foram os criminosos, ao que parece não foram procurados pela Interpol e até devo dizer que me diverti com o caso, em qualquer dos casos mesmo que soubesse quem eram nunca os denunciaria, mesmo que não partilhem dos meus ideais.
Sobre os factos
A questão suscitada no ‘i’ é velhinha, foi publicada na edição do Público no dia 27 de Outubro de 2010 (ver anexo). Nessa notícia dava-se conta do arquivamento de um processo por se ter concluído pela inexistência de qualquer quebra de confidencialidade. Não é o que afirma a notícia do ‘i’ que sustenta que o processo terá sido arquivado porque a Interpol não terá conseguido identificar o blogger ou blogger responsáveis pela suposta fuga de informação.
Curiosamente o ‘i’ não refere qualquer post que indicie fuga de informação, a única referência que faz refere-se a um mero exercício de direito de opinião que nem sequer pode ser considerado ofensivo para o visado.
Em qualquer dos casos nunca aqui foi feita qualquer quebra de confidencialidade nem usei qualquer informação confidencial fora no âmbito da minha vida privada. Aliás, esta questão nem se coloca pois há muito anos que não, desde antes da criação do blogue, que não exerço funções que me permitam o acesso a tal informação.
O exercício do contraditório pelo jornalista
O jornalista deu-me a oportunidade de prestar esclarecimentos que foram usados para compor a notícia, diria mesmo que para além do “termo de identidade” que o jornalista pretendeu fazer pouco mais acrescenta para além dos meus esclarecimentos. Por uma questão de princípios éticos não divulgarei aqui os emails enviados pelo jornalista, reproduzo apenas a minha resposta.
Pelas respostas que dei torna-se evidente que o ‘i’ pretendia muito mais do que proceder à suposta identificação de um blogger, deduz-se que havia a preocupação de saber se tinha tido qualquer envolvimento no afastamento de dois dirigentes da DGCO. Sucede que um dos dirigentes não foi afastado pois cumpriu o mandato, o motivo para a sua não recondução foi público, em resposta a muitos protestos públicos o primeiro-ministro defendeu que não era aceitável que um director-geral ganhasse mais do que o Presidente da República.
O segundo caso de afastamento é mais recente e aconteceu com a mudança de governo, momento em que os directores e subdirectores-gerais podem ser substituídos se não merecerem a confiança política dos respectivos membros do governo, Sucede que entre a última crítica feita n’ O Jumento ao dirigente em causa e a sua substituição, não só foi reconduzido uma vez como julgo que chegou mesmo a ser louvado. Portanto não faria sentido qualquer relação entre o blogue e a substituição do dirigente em causa, nem mesmo o argumento do saneamento político serve, antes da sua substituição quase todos os altos dirigentes da DGCI que estavam em funções foram nomeados pelo PSD, alguns são tidos como tendo ligações ao PSD e foram mantidos à excepção de um.
Sobre a face oculta desta notícia
Estou convencido de que houve um bufo que fez passar emails pessoais aos jornalistas, aliás, isso é público em relação a outras pessoas e também sei que há quem ande a zurrar juras de vingança pelos corredores do fisco contra quem julga que o tramou, a própria notícia aponta para a pista. Este país é uma pequena aldeia e neste momento não tenho grandes dúvidas sobre quem “encomendou” o serviço.
Todavia, devo dizer que excluo qualquer envolvimento nesta manobra vingativa de um conhecido administrador de um banco e ex-director-geral da DGCI.
Sobre a fonte e motivações da notícia
Este país é uma aldeia, todos sabemos quem é amigo de quem e com base no que vem na notícia não é difícil de calcular quem motivou esta notícia. Mas isso é um tema para outro dia.
ANEXOS:
As notícias do Público de 27.10.2008:
Mensagens dos funcionários dos impostos foram inspeccionadas
Por Vítor Costa
Auditoria da Inspecção-Geral de Finanças passou à lupa as mensagens de e-mail enviadas para órgãos de comunicação social
A Inspecção-Geral de Finanças (IGF) analisou milhares de mensagens de e-mail de centenas de funcionários dos impostos e, após obter uma autorização judicial, leu o conteúdo de muitas dessas mensagens, designadamente as enviadas para órgãos de comunicação social com o objectivo de identificar fugas de informação. A consulta, feita sem conhecimento dos funcionários, foi realizada no âmbito de uma auditoria da IGF prevista no seu plano de actividades para 2006, que mereceu a concordância do ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, em Novembro de 2005.
Estes dados fazem parte de um processo aberto no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa que o PÚBLICO consultou e que teve origem numa queixa feita à Polícia Judiciária (PJ) pelo anterior director-geral dos Impostos, Paulo Macedo, em Outubro de 2005. O então responsável da máquina fiscal denunciou um conjunto de situações que, segundo ele, indiciavam fugas de informação por parte dos funcionários que, dessa forma, violavam o dever de sigilo a que estão sujeitos.
Para chegar à origem do caso é, no entanto, preciso recuar até 2005.
Na queixa à PJ, Paulo Macedo, actualmente administrador do Banco Comercial Português (BCP), diz que desde que assumiu o cargo de director-geral se apercebeu das várias fugas de informação. E deu exemplos, entre os quais o facto de a sua situação fiscal referente ao período anterior à sua nomeação para director-geral ter aparecido nos jornais já depois de ter assumido o cargo.
Apesar das denúncias e das diligências efectuadas o processo foi arquivado em meados de 2006.
Auditoria da IGF
Mas o processo não tinha acabado. Ainda antes do arquivamento da queixa pelo DIAP, fora iniciada uma auditoria da IGF com o objectivo de averiguar se havia violação de sigilo por parte dos funcionários através das mensagens de e-mail enviadas para os órgãos de comunicação social.
A auditoria analisou as mensagens electrónicas enviadas e recebidas pelos funcionários da DGCI, da Direcção-geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DGAIEC) e da Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros (DGITA) para 17 órgãos de comunicação social.
Entre mensagens enviadas e recebidas, foram analisadas contas de e-mail de mais de 370 funcionários e mais de 30 mil mensagens entre 12 de Novembro de 2005 e 8 de Junho de 2006. Numa primeira fase, e seguindo as orientações que existem da Comissão Nacional de Protecção de Dados, só foi analisada a origem e o destino das mensagens e o que aparecia escrito no espaço destinado ao assunto (subject).
Queixa reaberta
A auditoria da IGF terminou entretanto e as suas conclusões levaram Paulo Macedo a requerer a reabertura do processo no DIAP, o que aconteceu no início de 2007. O DIAP solicitou, então, a colaboração da IGF e essa colaboração foi concedida pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, na altura, João Amaral Tomaz.
No âmbito dessa colaboração, realizou-se uma reunião entre o DIAP e a IGF onde foram apresentadas as conclusões do relatório realizado pelo órgão de inspecção do Ministério das Finanças. Entre 12 de Novembro de 2005 e 8 de Junho de 2006 foram identificados 36 funcionários da DGAIEC que enviaram mais de 600 mensagens para órgãos de comunicação social; 313 funcionários da DGCI que enviaram mais de seis mil mensagens; e 27 funcionários da DGITA que enviaram mais de 1100 mensagens.
Foi também nesta altura que a IGF sublinhou que os seus inspectores apenas consultaram o assunto (subject) da mensagem e não o seu conteúdo e, como tal, não foi possível averiguar se houve violação do dever de segredo por parte dos funcionários. Assim, a própria IGF sugeriu que se devia consultar o conteúdo das mensagens.
Para poder aceder ao teor das mensagens, o DIAP enviou o processo para o Tribunal de Instrução Criminal e pediu autorização para aceder ao conteúdo do e-mail do funcionário da DGAIEC com mais mensagens enviadas e dos 22 funcionários da DGCI que mais mensagens enviaram para os órgãos de comunicação social. O DIAP pediu ainda acesso às pastas pessoais destes funcionários e às suas áreas de trabalho no computador.
O Tribunal de Instrução Criminal sublinhou que as mensagens em causa correspondiam a correspondência já aberta e, como tal, cabia ao Ministério Público proceder à sua apreensão.
E foi o que aconteceu. O DIAP ordenou à direcção de serviços de segurança informática da DGITA que fornecesse aos inspectores da IGF os backups dos servidores de correio electrónico da DGITA relativamente ao período entre 12 de Novembro de 2005 e 8 de Junho de 2006. O mesmo sucedeu com os backups das pastas pessoais de correio electrónico e áreas de trabalho para o mesmo período.
Em Julho, o processo começou, no entanto, a afundar-se. A IGF recebeu a informação da DGITA, mas apenas identificou uma quantidade residual de mensagens que se dirigiam a órgãos de comunicação social.
Já este ano, a mesma IGF entregou um último relatório ao DIAP onde explicava o desaparecimento das mensagens: já não foi possível recuperar as mensagens referentes aos funcionários seleccionados para o período entre Novembro de 2005 e Junho de 2006. Porquê? Os backups apenas eram mantidos por oito semanas e a informação para essa data já não existia.
Perante esta situação, a IGF, a 10 de Julho, limitou-se a recolher as pastas de e-mail de 22 utilizadores. Dessa recolha foram analisadas 13.247 mensagens, mas destas apenas 813 se dirigiam a órgãos de comunicação social, e as mensagens nada revelaram que indicasse uma saída indevida de informação, o que levou o processo a ser, mais uma vez, arquivado.
O PÚBLICO perguntou às Finanças se Teixeira dos Santos tinha conhecimento desta auditoria e se tinham sido abertos processos contra funcionários. O ministério respondeu apenas que "o Plano de Actividades em causa reporta-se a uma auditoria que foi feita, no passado, à segurança informática de várias entidades, incluindo a DGITA. Em concreto, a DGITA foi auditada tendo em conta que há informação protegida pelo sigilo fiscal e que necessita de verificação periódica pelos serviços da IGF. A IGF agiu no exercício das suas funções e deu conhecimento do andamento das diligências a todas as entidades envolvidas". O PÚBLICO também perguntou a Paulo Macedo qual o motivo que o levou a colocar a queixa e pediu-lhe para comentar o desfecho da mesma, mas não obteve resposta.
O ministro Teixeira dos Santos autorizou a auditoria que tinha como objectivo investigar fugas de informação
O Jumento chegou à Interpol
Autoridades pediram a congénere dos EUA que identificasse autor do blogue
A Polícia Judiciária pediu ao gabinete nacional da Interpol que tentasse saber junto da sua congénere nos Estados Unidos da América (EUA) quem é, ou quem são, os autores do Jumento, um blogue que se dedica essencialmente a relatar alegados acontecimentos ocorridos no interior da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI).
A intervenção da Judiciária no processo decorre de uma queixa do anterior director-geral dos Impostos, Paulo Moita Macedo. O inquérito procurava detectar os autores de alegadas fugas de informação da DGCI e dele consta uma exposição enviada a Paulo Macedo em Outubro de 2005 pelo director distrital de Finanças de Lisboa. Nessa informação, o director distrital de Finanças queixava-se que os textos publicados no Jumento eram difamatórios e passíveis de denegrir a imagem dos funcionários da administração fiscal.
Em Novembro de 2005, a Polícia Judiciária pediu ao director do gabinete nacional da Interpol que efectuasse diligências junto da sua congénere nos Estados Unidos, já que o referido blogue era administrado por uma empresa com sede em Portland. O pedido enviado para Washington tinha por objectivo determinar quem era o autor do blogue ou apurar os registos de identidade que permitissem identificar o seu autor.
A resposta das autoridades norte-americanas chegou em Março de 2006, mas não foi positiva, uma vez que a legislação norte-americana protege as informações respeitantes a registos de transmissões electrónicas, ou seja, seria necessário um pedido formal dirigido aos EUA nos termos do tratado de assistência mútua.
Perante estes factos e depois de ter visionado o blogue durante algum tempo, o Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa concluiu que nada foi encontrado que consubstanciasse violação do dever do segredo dos funcionários e, como tal, arquivou a queixa. V.C.
A minha reposta ao mail enviado pelo jornalista:
Caro Paulo Mascarenhas,
Diz-me que tem provas sólidas e fundamentadas assentes em correspondência, todavia não me diz do quê fazendo supor a existência de alguma acusação que desconheço. A sequência de perguntas que me faz supor a existência dessa acusação pelo que me confronta perante uma situação curiosa, acusa-me de algo e interroga-me sem me dar o direito de me defender.
De qualquer das formas tenho muito gosto em responder-lhe às questões que me coloca:
Não fui responsável por qualquer fuga de informação, até porque não tendo acesso a informação confidencial relativa à DGAIEC nunca poderia ser responsável por tais fugas. Se bem me recordo o que motivou essa queixa do Dr. Paulo Macedo terá tido relação com questões relacionadas com a sua própria situação fiscal na altura noticiadas pelo DN, pelo que tudo isso me passou ao lado.
Desconheço o conteúdo da exposição do Dr. Marcelino a que se refere, o que sei foi o publicado pelo jornal Público e, tanto quanto me recordo, terá sido apresentada uma queixa por ofensa à instituição DGCI, que terá sido arquivada por falta de crime.
Não posso assegurar que os comentários do blogue não tenham denegrido a imagem de alguém da DGCI ou de qualquer outra instituição, quando pomos em causa esta ou aquela situação isso pode ser uma inevitabilidade.
A causa da não recondução do director-geral dos Impostos, no pressuposto de que se refere ao Dr. Paulo Macedo (já que o Dr. Armindo Ribeiro foi afastado para dar lugar ao Dr. Paulo Macedo), terá sido, como foi público, uma consequência do compromisso assumido pelo primeiro-ministro em relação aos vencimentos nos altos cargos da Administração Pública. Tanto quanto foi público terá sido esse o motivo da não recondução do Dr. Paulo Macedo.
A não recondução (e não demissão como refere na pergunta) do director de finanças de Lisboa foi, tanto quanto soube pela comunicação social, uma decisão do actual governo. Como sabe os altos dirigentes podem ser substituídos quando muda uma governo (algo de que sempre discordei) e terá sido opção da actual equipa do ministério das Finanças a não recondução do DF de Lisboa, o mesmo tendo sucedido aparentemente com uma outra subdirectora-geral da DGCI. O facto de os directores de finanças do Porto e de Lisboa serem equiparados a subdirectores-gerais tornam-nos vulneráveis a uma substituição.
De qualquer das formas, já muito depois de qualquer crítica que pudesse ser entendida como um ataque ao então director de finanças de Lisboa este não só foi reconduzido no cargo como julgo que terá sido mesmo louvado aquando do regresso do Dr. Paulo Macedo ao BCP.
Ainda que me pareça que a sua pergunta sobre a minha participação no SIMplex tenha mais de curiosidade pessoal do que de jornalismo não deixarei de lhe responder. A minha participação no SIMplex, de que não estou arrependido, decorreu das minhas opções políticas face a um quadro de opções em que sou confrontado à esqueda do PS com projectos políticos que considero pouco democráticos e à direita com dois líderes em que não confio. Apesar de independente sou eleitor da área da área da social-democracia e nestas eleições esta opção era defendida exclusivamente pelo PS.
O facto de ter participado no SIMplex não me impede de ter tido ou de ter uma visão crítica deste ou de qualquer outro governo.