quarta-feira, agosto 13, 2008

Algo tem de mudar no sector das pescas


Há quarenta anos a lota de Vila Real de Santo António (como a de Olhão, Portimão ou Matosinhos) vendiam mais sardinha num dia do que aquela que é vendida em Portugal durante um bom par de semanas. Nessa altura quando a primeira traineira chegava ao mar alto ainda a última estava no cais, cada traineira era acompanhada por duas enviadas (embarcações apenas com porão, que serviam para transportar o peixe para terra) e era raro o dia em que não se pescava. Hoje pescam em toda a costa algarvia pouco mais de meia dúzia de traineiras para pescarem umas quantas caixas de peixe, isso se a pesca correr bem.

Os stocks de peixe estão quase extintos, o fundo do nosso mar tende a ser um deserto marinho. Apesar deste cenário a nossa política de pescas não passa de umas idas a Bruxelas para discutir as quotas de pesca. Os nossos responsáveis ministeriais são sempre homens ligados à agricultura, em regra ligados ao sector dos cereais ou dos lácteos (os dois grandes grupos de pressão do sector agrícola), de peixe pouco mais sabem do que distinguir os talheres de peixe dos de carne e se sabem nadar aprendera a fazê-lo em piscinas de água doce.

Ao longo dos anos a gestão do sector limitou-se a consistir na distribuição de licenças de subsídios, umas vezes dão-se subsídios para a construção de embarcações, dois anos depois dão-se subsídios para abater embarcações. Em torno destes subsídios formou-se uma casta de armadores especializados nos corredores da política, o seu negócio é construir embarcações com subsídios a fundo perdido para mais tarde venderem as licenças e embarcações aos espanhóis ou receber subsídios de abate. Pouco lhes interessa a sobrevivência do sector, quando a pesca rende exploram os stocks até à exaustão, quando nada mais há para pescar encostam a embarcação à espera de comprador ou do subsídio de abate.

O sistema de venda de peixe permite que os pescadores sejam os que menos ganham, há compradores a chantagear os pescadores impondo-lhes a lota onde devem vender, outros compram em quantidade para vender de novo à porta da lota. É um mercado em que não existe qualquer relação entre o custo da mercadoria e o preço a que é vendido, imagine-se, por exemplo, que os automóveis eram vendidos em lota, se assim fosse poder-se-ia comprar um Mercedes ao preço da sucata, da mesma forma que a sardinha poder ser comprada na lota para produção de farinhas de peixe.

Algo tem que mudar nas pescas portuguesas, enquanto elas existirem e isso não passa pelas reivindicações dos armadores, muitos deles tão prejudiciais para o sector como são os intermediários ou ministros formados na cultura de que “peixe não puxa carroça”.