Seguro não tiver a boca a saber a papel de música por causa da ressaca de uma noite de tantos festejos, estará agora na dúvida em saber se o estranho gosto que sente é o de uma derrota com sabor a vitória ou de uma vitória com sabor a vitória. Por aquilo que se viu ontem à noite pode-se concluir que Seguro festejou uma derrota vitoriosa como se estivesse acabado de vencer as legislativas com maioria absoluta.
Pode-se dizer que para vencer bastar ter mais um voto, mas a verdade é que as eleições não são propriamente uma corrida em que basta ganhar por um centésimo de segundo. Neste caso Seguro teria acabado de ganhar uma corrida dos cem metros por um centésimo de segundo contra dois adversários que corria de pé coxinho.
É evidente que os resultados de Seguro foram penalizados pela abstenção, pelo voto em Marinho Pinto ou pelo crescimento de um PCP que canibalizou metade do Bloco de Esquerda que vai morrendo à medida que envelhece com uma boa parte dos seus eleitores a dispersarem-se pelos outros partidos. Seguro não conseguiu capitalizar qualquer descontentamento e a apresentação de propostas para as legislativas foram um fiasco.
A campanha do PS foi pobre, com um cabeça de lista a não conseguir demonstrar ser muito melhor ou muito diferente do seu amigo esganiçado que liderava a direita, faltou-lhe a inteligência para perceber que não estava num pequeno debate televisivo com o seu velho amigo e que o que estava em causa era muito mais do que as pequenas desavenças ou uma questão meramente pessoal.
Seguro fez surf nas sondagens privadas e estava tão empolgado que decidiu dar um pulo para as legislativas, apresentando um mini programa eleitoral, Rangel apresentou os 101 dálmatas, Seguro optou por 80 caniches. Os portugueses ficaram a saber que Seguro estava muito preocupado com os 23% de IVA pagos num sector onde a regra é os empresários se apropriarem de uma boa parte do IVA e que para cumprir esta promessa eleitoral a solução passa por manter os cortes inconstitucionais dos vencimentos dos funcionários públicos.
Esta última decisão mostra bem o pensamento político da equipa de Seguro, depois de sucessivos pedidos ao Tribunal Constitucional para declarar esses cortes como inconstitucionais e depois de não subsistirem quaisquer dúvidas a esses respeito, António José Seguro decidiu declarar esses cortes como quase definitivos, isso depois de o governo ter anunciado a sua eliminação progressiva. Seguro e a sua equipa de brilhantes belezas perderam o apoio de muitos e a confiança de uma boa parte dos eleitores.
Seguro pode festejar a sua segunda vitória consecutiva e até pode fazer contas e concluir que teve mais do que a direita toda junta, mas é óbvio que foi uma vitória que não aquece a alma a ninguém. Quem ganhou ontem à noite foi Cavaco Silva que depressa vai concluir que os eleitores apontam para um consenso em trono do excesso de troikismo que foi mantido no programa dos 80 caniches de Seguro. Os portugueses ficaram a saber que a única divergência insanável entre os dois velhos amigos da jotas está no IVA das bicas.
Seguro parece querer convencer os eleitores pelo cansaço mesmo que isso signifique mais uns anos de governo de ou com a direita, a perda de mais alguns direitos sociais e mesmo a redução do PS a um PASOK. Mas Seguro é como Passos Coelho, não sabe quando mas tem a certeza de que há-se ser primeiro-ministro custe o que custar, resta saber a quem vai custar a satisfação da sua ambição.
Quanto tempo levarão os militantes do PS a perceber que não são eles que impingem um líder ao país, é o país que escolhe o seu líder e não têm faltado oportunidades para que tenha deixado claro que Seguro não é a solução que o povo pretende. Resta ao PS ir de encontro ao que o povo pretende ou ir de encontro a uma parede e estatelar-se como tem sucedido aos partidos socialistas europeus que de cima da sua arrogância ignoram a vontade dos países.