Estávamos todos de férias na Praia do Cabeço, ali para os lados da mítica Praia dos Três Pauzinhos onde a miudagem ia lanchar nos passeios da escola primária, com o matulão do professor Caldeira à frente, quando dei por mim com a sensação de que na roda de amigos era o único que ainda não sabia que curso pretendia tirar o meu filho. A terrível ideia do pai saber parece que ajudava ao silêncio colectivo dos meus amigos.
Senti no ar que ali havia marosca quando alguém me contou a grande novidade, o meu filho queria ir para uma universidade algures no país tirar um daqueles cursos que nos tornam em espectadores especializados do Canal Odisseia. Foi então que perguntei ao rebento se era mesmo aquele curso que pretendia seguir ao que me respondeu que sim.
Por mim tudo bem mas na condição de o tirar pagando-o com o que ganhasse a carregar baldes de massa, porque a propósito de massa esta não abunda e eu não alimento burros a pão-de-ló deixando que um filho fosse tirar um desses cursos em que o único empregado é o professor que dá três ou quatro horas por semana e depois vai para a praia coçar os tomates e fazer investigação.
Foi o escândalo na Praia do Cabeço, que eu devia respeitar a vocação do rapaz, que ele podia ser feliz, etec., etc.. Tudo bem, mas insisti com o rapaz que primeiro tirasse um curso que além de o satisfazer durante o tempo de estudo lhe satisfizesse uma necessidade básica, o emprego e os rendimentos necessários à sua independência. Um pouco a contragosto o moço percebeu e lá começou a visitar os sites das universidades em procura de um curso que respeitasse três condições: podia entrar com a média que tinha (pois como tencionava tirar o tal curso de espectador do Canal Odisseia não precisava de grandes notas), que preenchesse os seus gostos e que oferecesse garantias de emprego.
Uns dias depois veio-me falar de um curso que ele desconhecia e que segundo a Universidade Nova garantia ter saídas de emprego, era uma coisa chamada “engenharia dos materiais”. Lá se inscreveu e a alma até me doía quando o via agarrado aos canhamaços de matemática, física e química, areia de mais para quem se imaginava a estudar nas areias da praia da Ilha de Faro. Mas o rapaz lá teve que puxar pela cabeça e até se saiu bem.
Terminado o curso ainda andou um ano como investigador na Universidade Nova mas perante a falta de grandes saída e desgostoso com o ritmo de trabalhão arregaçou as mangas e foi em busca de melhor. Depressa se desenrascou, como se desenrascaram quase todos os seus colegas de curso incluindo os que entretanto tinham sido despedidos na sequência da falência da Quimonda.
E u fiz o papel de pai tirano mas entre ter um licenciado em violino a fazer reposições nas grandes mercearias do Belmiro, um licenciado em relações internacionais a fazer de banheiro na Praia das Maçãs e um licenciado em engenharia dos materiais com emprego e perspecivas de vida prefiro ser o pai tirano, até porque um bom curso custa por vezes muito menos dinheiro do que muitos desses cursos da treta. E o mais importante de tudo, o moço desenrascou-se arranjou emprego no meio da pior crise de que tenho memória.
É o conselho que dou a todos os jovens, desenrasquem-se primeiro e depois tirem desses cursos onde os TPC são feitos no Bairro Alto e as semestrais na Praia da Caparica. Desenrasquem-se!