quinta-feira, abril 16, 2015

A austeridade como alternativa à austeridade

Não acredito que uma eventual reestruturação da dívida seja equacionável num horizonte temporal que nos permita dispensar de pensar noutras soluções. Também não acredito que uma eventual reestruturação passe por um perdão de dívida a suportar por outros países da EU, Portugal não foi vítima de nenhuma calamidade que o tenha obrigado a suportar grandes investimentos e nem sequer podemos pedir reparações de guerra aos alemães pois nesse capítulo a nossa história não é das mais exemplares. E depois de termos do FCP ter arrefinfado três golos ao Bayern de Munique receio que a simpatia dos alemães esteja ao nível da dos finlandeses.
  
A crise da nossa economia é bem anterior à crise financeira e se não fossem os milhões de ecus investidos na sequência da adesão à então CEE poderíamos dizer que o país nunca recuperou do choque petrolífero do início dos anos 70 e de um modelo económico miserável herdado de um Salazar que também gostava de exibir cofres cheios. Alguns dos problemas que tínhamos então ainda subsistem, as grandes diferenças estão no Estado Social que agora querem destruir, nas infraestruturas que agora sugerem ter sido negócios corruptos de Sócrates e a aposta nas energias renováveis às quais muito boa gente opôs a solução nuclear.

Não é uma política idêntica à seguida desde que Cavaco criou uma cultura governamental assente em vitórias eleitorais conseguidas à custa de inaugurações, tentando sujeitar a economia e os ciclos económicos aos ciclos eleitorais, que conseguiremos resolver os problemas que nos impedem de atingir novos patamares de crescimento. O país tem recursos escassos e isso significa que a despesa fácil, seja a orientada para o consumo ou para o investimento público pouco reprodutivo, não vai trazer as empresas que se deslocalizaram ou as que não são atraídas por um mercado escasso, com poucos recursos, uma mão-de-obra pouco qualificada e o um Estado burocrático onde os seus dirigentes se entretêm a inventar multas e multinhas, taxas e taxinhas, custas judiciais e outras fontes de receita para pagarem mordomias, passagens à reserva ou outros pequenos esquemas.

Portugal tem dois grandes problemas, os seus recursos naturais e humanos são escassos em quantidade e em qualidade e quer no sector público, quer no sector privado há elevados níveis de ineficiência. São problemas que não se resolvem nem com mais despesa pública cega e muito menos com cortes abusivos para alimentar balões de oxigénio que se tornaram necessários a partir do momento em que o país começou a ter menos fundos comunitários. Este caminho não leva a nada e os que hoje defendem reduções salariais sucessivas, ainda vão concluir que a crise não se resolve sem o regresso à escravatura e mesmo assim é bem provável que com os padrões actuais seria mais caro alimentar e vestir um escravo europeu do que pagar o salário a um trabalhador do Bangladesh.
    
O país tem graves problemas no curto prazo cuja solução apenas pode ser encontrada no médio e longo prazo e essa solução passa por gerir melhor o país a todos os níveis. Se não temos grandes recursos naturais, se precisamos de qualificar os recursos humanos, então teremos de tornar o país mais eficaz onde os recursos investidos são suficientes e os resultados estão aquém do desejável. Isto significa que os governos devem ser austeros e gerir os recursos escassos com muita austeridade, algo que o actual governo se recusou a fazer, apesar do famoso discurso das gorduras.
  
O país tem de ser eficiente na gestão dos serviços públicos onde as chefias e os seus gabinetes de apoio cresceram exponencialmente e sem que se tenha sentido mais competência, tem de resolver de vez os atrasos de uma justiça gerida por personagens medievais, tem de ser eficiente na gestão das empresas privados onde o próprio FMI reconheceu existirem grandes problemas de competência.
  
Se não há muito com que gastar então deve ser-se muito criterioso no momento de gastar, para que essa despesa se multiplique em mais riqueza no médio prazo. Deve-se ser criterioso nos investimentos públicos, devem evitar-se a imensidão de despesas administrativas que consomem uma boa parte dos investimentos e ser orientados para a produtividade, a qualificação e a competitividade. Deve-se ser austero na forma como se gasta no Estado e acabar com um princípio de gratuitidade cego que neste momento é financiado por cortes brutais em salários e um dia destes alguns serviços do Estado serão tão maus que nem gratuitos muitos portugueses os vão querer, situação que, aliás, já sucede nalguns sectores, como o da saúde, ainda que também devido a medidas maldosas do governo.
  
O país não precisa desta austeridade cega, estúpida e velhaca, mas com recursos escassos, uma dívida que ninguém nos vai pagar e com problemas económicos que duram há décadas não nos resta outra alternativa do que ser austeros e de começarmos a apostar numa estratégia de eficiência total, rompendo com séculos de ineficiência.