sábado, março 22, 2008

A culpa só pode ser da professora ou da ministra


Acerca da cena de violência na Escola Secundária Carolina Michaelis tenho visto os mais diversos comentários, para uns a culpa é da professora, para outros é da política da ministra. Não me admiraria nada que se lembrasse de promover uma colecta para oferecer um telemóvel novo à jovem e, com o dinheiro que restasse, até se poderia promover uma festa de confraternização entre a aluna e a professora.

Os sindicalistas dos professores do Norte defendem que a culpa é da ministra da Educação, a aluna é vítima de um engano político e a professora agora tem que suportar hordas de alunas enfurecidas pela mensagem da ministra. Vejamos, a rapariga tem visto todos os telejornais, os debates do Prós & Contras e as intervenções da ministra da Educação e chegou à conclusão de que estes professores são uns malandros, que devem, levar na cabeça. Passou das palavras aos actos, decidiu que podia mandar sms nas aulas e quando a professora ousou tirar-lhe o telemóvel aplicou as regras da desobediência civil, provavelmente aprendidas num curso de fim-de-semana dos verde-eufémios ou do BE. Parta os sindicalistas a professora foi vítima inocente da ministra, em três anos aquela jovem exemplar e respeitadora transformou-se numa caçadora de professores.

Para os politicamente correctos a culpa também é da professora que não esteve à altura da situação, devia ter pedido à menina que entregasse o telemóvel e perante a sua recusa deveria tê-la convidado a sair da aula.

Imagino que para os liberais a culpa também é da professora, a propriedade individual é inviolável e nunca deveria ter procedido à nacionalização do telemóvel, antes pelo contrário, deveria ter protegido o direito à posse e usufruto da propriedade, em vez de tirar o telemóvel à rapariga deveria ter criado condições para que a qualidade da aula fosse compatível com o usufruto do mais elementares dos direitos, o direito à propriedade.

Para os pedagogos progressistas a culpa só pode ser da professora, a matulona que vemos no vídeo é uma jovem vulnerável, provavelmente vinda de uma família desarticulada, cabe à escola encaminhá-la e se isso não sucedeu foi porque a escola e, em particular, a professora foram incompetentes. A professora deveria ter feito tudo para explicar à jovem que não deveria usar o telemóvel na aula e se todas as estratégias pedagógicas falhassem ainda poderia tentar usar o telemóvel para a explicação das matérias, por exemplo, se a aula fosse de inglês poderia sugerir que a rapariga mandasse os sms em inglês.

Para os pais do rebento a culpa só pode ser da professora, não só pagam os impostos para sustentar a escola como a educação é um direito constitucional que cabe ao Estado a assegurar. Se a pequena é mal-educada é porque os professores e, em particular, esta professora são incompetentes. Ainda assim desculpam a professora, tal como esta é vítima da ministra da Educação eles são trabalhadores explorados, sujeitos a horários de trabalho intensos que não lhes permite educar a menina, tal como a professora e a própria aluna são todos vítimas do capitalismo.

Portanto, estamos todos de acordo, a culpa é da professora e da ministra, mas primeira deve ser absolvida pois, tal como a aluna e os seus pais, é vítima de um sistema representado pelas políticas da ministra. Absolva-se a jovem, manifeste-se solidariedade para com os seus progenitores, tenha-se pena da professora e condene-se a ministra.

Ficamos todos descansados, os pais podem continuar a não assumir a responsabilidade de educar os filhos, os conselhos executivos podem continuar a ignorar os incidentes, a professora pode continuar a levar porrada e a ministra está lá para ser a culpada.