A iniciativa de organizar um comício num momento em que este aparece como resposta a uma manifestação de um grupo profissional foi um erro do PS, abdicar da legitimidade constitucional para transferir a luta política do parlamento para a rua, medindo a representatividade pelos decibéis do sarrabulho não faz sentido. Nada acrescenta à democracia saber quem consegue fazer mais barulho, se uma manifestação de um grupo profissional ou se os mais activos elementos do aparelho partidário.
Agora o PS está obrigado a promover um comício participado, alegre e sem velhotes que lá estão porque os levaram a passear à Ribeira e a beber um cálice de Porto. Depois dos erros de casting nas cerimónias governamentais e da tristeza de ver velhotes das Beiras a celebrar a magra vitória autárquica de António Costa, os jornalistas estão mais interessados em perguntar aos comiceiros mais apáticos se sabem ao que vieram, do que em ouvir Sócrates de quem não se esperam novidades.
Mas se a democracia se resolve no parlamento não é raro que a sua defesa tenha que ser na rua, este é o espaço preferido pelos que não conseguem convencer os portugueses a elegê-los pois uma dezenas de milhares de militantes parecem uma maioria mais expressiva e representativa do que cento e tal senhores sentados no hemiciclo. Para a extrema esquerda não são os deputados que representam o povo, são uns quantos milhares de militantes a marchar nas ruas. A representatividade parlamentar faz parte de um sistema onde os eleitores são idiotas sendo sistematicamente enganados e levados a escolher os deputados errados.
Para o PCP e o BE o parlamento não representa o povo, são as suas estruturas dirigentes que foram escolhidas para representar a maioria do povo que o representam, os deputados não passam da escolha inevitável de uma democracia imperfeita porque assenta no voto popular e não numa minoria vanguardista esclarecida.
Como era de esperar o comício do PS estimulou a intolerância e já está em curso a organização de uma contra-manifestação com o objectivo de intimidar e de levar os jornalistas e as televisões a filmar a rua. A estratégia não é nova, há meses que uma máquina bem organizada vigia a agenda dos políticos de Sócrates para lhes fazer esperas, desde que alguém decidiu que esta democracia imperfeita está a degradar-se que estas esperas se sucedem, umas vezes são os sindicalistas, outras um qualquer grupo profissional, mais recentemente e porque começaram a dar nas vistas começaram a ser espontâneas.
Mas como a espontaneidade destas iniciativas duvidosas começa a ser evidente o secretário-geral da Fenprof veio de véspera desmobilizar os professores, ele que organizou tantas esperas umas vezes como cidadão, outras como militante do PCP e outras tantas como sindicalista. De repente percebeu que a estratégia podia dar resultados e ficou preocupado com a má imagem que a iniciativa poderia trazer à luta dos professores.
Talvez seja tempo de fazer perceber à extrema-esquerda que não é só no parlamento que perde, também pode perder nas ruas como já sucedeu no passado. Até aqui tem havido uma guerra surda entre a extrema-esquerda e o PS, quando estiver em causa a democracia essa luta dirá respeito a todos os democratas.