De repente todos os liberais desapareceram, todos os anti-liberais andam à procura deles, os comunistas receiam pelas suas próprias poupanças, Cavaco Silva (o mesmo que em tempos deu um valente pontapé na bolsa) anda preocupado com os pobres, Manuela Ferreira Leite continua desaparecida e José Sócrates vai ao parlamento falar da crise.
Quando a crise parecia resumir-se à falência de uns quantos bancos geridos por administradores pouco ambiciosos e pouco escrupulosos até Pacheco Pereira ainda acreditava na mão invisível de Adam Smith enquanto Manuela Ferreira Leite vinha em defesa dos mercados ofendidos pelas declarações de Sócrates. De repente não há mão invisível que nos salve, são os governos que asseguram a tranquilidade dos pequenos depositantes sem que haja o mais pequeno protesto de Ferreira Leite ou de Pacheco Pereira.
Nenhum dos nossos defensores incondicionais do mercado questiona a decisão dos governos de garantir os depósitos, mais por medo de levarem uma tareia do que por terem mudado de opinião, além disso, nesta hora todos estão com medo de ver as suas poupanças desaparecerem e o melhor é uma breve interrupção dos nossos princípios, o fundamentalismo segue dentro de momentos.
Quem ficou eufórico foi Manuel Alegre que de cima da sua velha sapiência concluiu que era Marx que tinha razão, como se esta crise fosse a tal crise, aquela que anunciava a vinda do paraíso. Só que Marx não previu que uma das grandes vítimas da crise fosse precisamente as poupanças de um grande país comunista. Talvez por isso também os nossos comunistas estejam a fazer como os liberais, se é uma crise que nos conduzirá ao paraíso então que seja a próxima, porque esta apanhou os chineses descuidados, tão descuidados como se revelaram no controlo da qualidade do leite.
Numa coisa estão todos de acordo, temos que nos preocupar com os mais pobres, que se danem as perdas do Belmiro, que se esfumem as poupanças da classe média, o problema são os pobres. Portanto, temos que suportar todos os prejuízos dos ricos não vão os pobres ficarem ainda mais pobres.
Cá por mim estou a ficar mais preocupado com os pobres de espírito do que os pobres, estes já sobreviveram a muitas crises e nunca viveram melhor por não haver crise, já quanto aos primeiros começo a ter dúvidas quanto à sua sobrevivência.
Com o silêncio dos liberais, o empenho dos anti-liberais e o cinismo dos vendedores de utopias vamos salvar os ricos em nome dos pobres e com o dinheiro da classe média.