De vez em quando há um jornalista que se lembra, a propósito da dívida externa ou da dívida pública, de dividir estas dívidas por cada português para concluir quanto é que cada um de nós deve. Quando tal sucede interrogo-me porque carga de água um pobre de um agricultor que vive numa aldeia no meio da serra algarvia deve tanto dinheiro, não tem acesso a cuidados de saúde, para ter electricidade teve de pagar a rede à EDP, mora a quilómetros da estrada alcatroada mais próxima, não sabe o que são subsídios, ainda por cima conserva a floresta para que outros andem a negociar com CO2 e deve tanto dinheiro?
Fala-se muito de desigualdades sociais e muito pouco das desigualdades na distribuição dos benefícios da despesa pública que até consome uma boa parte da riqueza que o país cria. É por isso que faço uma proposta absurda, que seja adoptada uma fórmula para imputar essas dívidas pelos portugueses, até se poderia decidir que à semelhança das contabilidades empresariais ou das declarações para efeitos fiscais houvesse uma forma de cada cidadão saber em cada momento quanto da dívida externa ou da dívida pública lhe cabe.
Eu sei que a proposta é absurda, mas assim todos saberíamos quem ganha e quem perde com este estado social cada vez mais roto, com as grandes obras públicas ou com os múltiplos subsídios. Assim, na hora de pagar a conta em vez de aumentarmos os impostos de forma injusta, apenas alguns os pagam, poderíamos mandar a factura ao que tiraram proveito das múltiplas benesses.
O tal agricultor da Serra do Espinhaço de Cão poderia morrer tranquilo pois sabia que não só deixava as contas em dia como ainda deixava algumas poupanças pois deveria ser remunerado pelo contributo para o combate às alterações climáticas. Assim, nada disso sucede, na opinião dos nossos economistas e jornalistas o desgraçado deve uma fortuna e, pior do que isso, o seu bisneto quando nascer recebe como enxoval uma dívida partilhada de muitos milhões de euros.
Aquilo que proponho é um princípio muito lógico, o equivalente ao velho princípio comunista “a cada um segundo as suas necessidades, de cada um segundo as suas possibilidades”. Neste caso seria “a cada um as suas dívdidas”.
Aposto que se tal sucedesse a economia portuguesa seria muito mais saudável, os políticos mais cuidados, os cidadãos mais criteriosos nas escolhas eleitorais e os grupos corporativos menos exigentes.