Proponho-lhes um exercício: perguntem a todos dirigentes do Estado de que meios precisem para terem um bom desempenho e vão chegar à conclusão de que o PIB português não chegaria, multiplicar-se-iam os funcionários, as instalações, os lugares de chefia, as modernizações diversas.
Um PRACE para reduzir o peso do Estado? Foi um falhanço, eliminaram-se uns institutos que já não existiam, eliminaram-se uns serviços para inglês ver, muitas vezes os necessários para sobreviverem aqueles chefiados por amigos, esses como ouvi um director-geral dizer “estão fora de questão”. Nas três direcções-gerais que conheço bem teria eliminado muitas dezenas de serviços e teria aumentado a eficácia dos mesmos, e ainda pouparia o que o Estado gastou com os sábios contratados ao exterior. Deixaram-se enganar pelo montro, até houve serviços quase sem funcionários onde funcionários de outros departamentos assinavam o ponto para iludirem os sábios vindos de fora.
O problema do Estado está na sua cultura, uma cultura de décadas em que ganharam os mais espertos e perderam os mais inteligentes, ganharam os mais manhosos e perderam os mais capazes, ganharam os mais cobardes e perderam os mais corajosos, ganharam os mais servis e perderam os mais honestos. É uma cultura onde não se premeia o valor, a honestidade, a inteligência ou a capacidade, premeia-se sim a subserviência, o servilismo, o silêncio e a obediência ao chefe. É este o resultado de décadas de domínio do aparelho de Estado por gente que por não ter valor recorrer às estruturas partidárias para vencerem na vida, e venceram.
Sempre defendi aqui que todas as reformas da Administração Pública que não comecem pela mudança cultural falham, mas uma mudança cultural é coisa que não interessa aos partidos, significaria que em pouco tempo muitos dos dirigentes do Estado perderiam os seus lugares. A ideia de que quando muda o partido no governo mudam os boys é mentira, os boys dos diferentes partidos protegem-se, na minha direcção-geral são amigo íntimos que unem forças contra os que não alinham no sistema.
Alguém ousa denunciar este Estado de coisas, as pessoas incompetentes que são nomeadas, os prémios de excelência que foram atribuídos aos amigos e principalmente às secretárias dos directores, os técnicos competentes que perderam os lugares para os ceder aos protegidos pelos partidos, as despesas desnecessárias em salamaleques, as viagens desnecessárias ao estrangeiro, os pequenos abusos na partilha das instalações, os exércitos de secretárias de que se fazem rodear as chefias, as redes corruptas associadas a escritórios de advogados que se dão ao luxo de controlar a nomeação de dirigentes, as divisões com um funcionário, as direcções de serviços que não fazem falta? Não, nos primeiros tempos de funcionário público em Lisboa o que mais ouvi era que falava demais, no Estado a regra é a do silêncio, um código de silêncio idêntico à “omertà” da máfia. É mais fácil falar mal do primeiro-ministro, seja ele qual for, do que denunciar um abuso, criticar o boy mais poderoso do partido no poder ou do que lhe vai seguir.
Os funcionários públicos não vão ver o seu vencimento ser cortado para salvar o país, mas sim para salvar este imenso monstro que se alimenta de incompetência e alimenta incompetentes. Enquanto uns estarão a fazer constas à vida, outros já estão a pensar na forma como vão recuperar das perdas, o esquema que vão montar para recuperar o que agora perdem. O monstro continua vivo e de boa saúde.