Sempre defendi e continuo a defender que quando um primeiro-ministro ou um ministro das Finanças transparecer pessimismo deve demitir-se. Aos primeiros sinais de crise Cavaco Silva era um optimista, Braga de Macedo, seu ministro das Finanças, até descobriu que Portugal era um oásis no meio do oceano de crise europeia. Durão Barroso era um optimista depois de deprimir o país com o seu discurso da tanga, Ferreira Leite, a sua ministra das Finanças, andava feita uma barata tonta descobrindo sinais de retoma até nas cotações do PSI 20, na altura fui muito criticado pelos liberais quando aqui gozei com isso. Agora foi a vez de Sócrates ser um optimista e sem ter feito o discurso da tanga meteu-nos logo o fio dental.
É evidente que nenhum país cresce se o discurso dos governantes for pessimista, nenhum empresário nacional ou estrangeiro aposta num país em que nem os seus governantes acredita. Mas o optimismo não pode toldar o raciocínio e a capacidade de decisão, as medidas agora tomadas deveriam ter sido decididas há muito mais tempo, o realismo de agora impunha-se há seis meses, eu próprio defendi aqui em numerosas ocasiões a necessidade urgente de adoptar medidas sérias. Mas nessa altura Teixeira dos Santos garantia que tudo corria como previsto e Sócrates garantia que não ia ficar com uma parte do subsídio de Natal dos portugueses.
Agora vou perder o equivalente a um subsídio de Natal, mas como Sócrates é generoso optou por o cobrar em 14 suaves prestações acrescidas dos competentes juros cobrados sob a forma simpática de aumento dos descontos para a CGA, de cortes na ADSE e de um aumento de dois pontos no IVA. Entretanto acreditei no governo e tomei decisões com base nas declarações do ministro das Finanças e do primeiro-ministro cujas consequências vou ter de assumir, enquanto eu faço contas à vida e verifico se sou viável, o ministro das Finanças e o primeiro-ministro estarão ansiosos por conhecer as próximas sondagens.
É evidente que muitos portugueses vão apoiar estas medidas, até porque houve o cuidado de tramar os funcionários públicos que no tempo de Ferreira Leite foram eleitos como os responsáveis de todos os males e entre estes escolheram-se os menos pobres para reduzir o impacto eleitoral das medidas. É evidente que os mercados vão reagir bem e com medidas adicionais de liberalização do mercado de trabalho até poderá haver recuperação do crescimento.
Mas eu e muitos portugueses foram excluídos dos benefícios desse crescimento económico que parece ser mais desejado pelos benefícios eleitorais do que pelos benefícios sociais. Em poucos anos o meu mundo mudou, sinto que os funcionários públicos foram embarcados numa jangada de pedra que os leva em direcção a um rumo que não é o mesmo do resto do país.
José Sócrates e Teixeira dos Santos poderão estar optimistas mas eu não tenho razões nem para estar optimista, nem pessimista, a cigana leu-me a sina e já sei qual o meu futuro, perder vencimento sempre que os políticos errarem por excesso de eleitoralismo, não ser promovido, pagar as pensões dos que abusaram no passado. Eu sou a ovelha que Sócrates ou Pedro Passos Coelho vão tosquiar sempre que precisem de lã, é mais fácil tosquiar as ovelhas no redil da Função Pública do que apanhar as raposas que se escapam aos impostos.