Não é necessário fazer um inventário do que Souto Moura deixou, muito pouco foi feito que mereça manter para a história dos factos positivos da justiça portuguesa. Nem sequer um balanço, no caso de Souto Moura basta um balancete, tudo o que começou está por acabar, o processo Casa Pia arrasta-se e ainda se discutem os sinais no pénis de Carlos Cruz, o envelope n.º 9 foi o que se viu, a Operação Furacão acabou em Suão, o Apito Dourado perdeu o pio. Os únicos condenados durante o mandato de Souto Moura, inocentes ou culpados, foram os crucificados na comunicação social, sem julgamento nem direito a defesa, simplesente linchados sumariamente por decisão de alguém de que não se sabe nem o nome, nem as motivações.
Mas se a obra é escassa, as dúvidas são muitas.
Porque motivos alguns inocentes no processo Casa Pia foram queimados na via pública e houve nomes que graças a uma suposta prescrição nunca vieram a público? Qual o tratamento dado às "vitimas" envolvidas nos processos que foram a julgamento e às muitas outras, muitas mais do que as primeiras, que ficaram atrás do silêncio das paredes da Casa Pia? Terão recebido indemnizações idênticas aos que os advogados da Casa Pia exigem dos arguidos de serviço?
Ficaremos sem saber o porquê da tentativa bem sucedida de destruição da carreira política do líder do principal partido da posição, nem os motivos do empenho de uma conhecida vitima (de assédio, diz ele) nos ataques a Ferro Rodrigues. Alguém pode acreditar que as suas intervenções públicas (quantas vezes ao lado de gente do PP, como Bagão Félix) era feitas `margem da disciplina partidário e dos superiores interesses do partido?
O que se passou com as fugas sistemáticas e (por coincidência) cirúrgicas ao segredo de justiça foi uma vergonha para a justiça e um atentado grave para a democracia, nunca se ficará a perceber porque motivos ocorreram milhares de fugas ao segredo de justiça, não se tendo sido identificado um único responsável por essas fugas.
Mas conhecem-se as consequências, cidadãos queimados na praça pública, sem poderem exercer quaisquer direitos, fazendo-nos recuar aos tempos da Inquisição onde, ao menos, haviam simulacros de julgamentos. Uma democracia de pernas para o ar, com um governo incompetente a beneficiar nas sondagens da destruição dos seus opositores.
Embora a história nunca nos tenha dado grandes exemplos de magistrados em luta pela democracia, a regra é servirem os regimes (que lhes retribui a lealdade com privilégios e mordomias) considero o Ministério um instituição fundamental para a democracia, mas isso faz supor que os magistrados tenham como referência os valores constitucionais, não reagindo enquanto corporação.
É isso que espero do novo Procurador-Geral da República, quanto ao que agora cessa funções só desejo que vá com Deus. Que a democracia regresse à normalidade, que as "tropas regressem aos quartéis" de onde, para bem da democracia, nunca deveriam ter saído.
Esperemos que todos tenham entendido a lição, em democracia não há puros, justos ou castas superiores, cabe aos eleitores a escolha de quem os governa.