sexta-feira, novembro 21, 2008

A ditadura é mais eficaz do que a democracia?


A ideia de que a ditadura é mais eficaz do que a democracia não é nova em Portugal, nem à direita, nem à esquerda. A nossa direita é herdeira de uma ditadura que sempre se justificou afirmando que “a política é para os políticos”, a confusão política gerada pela democracia seria um obstáculo ao desenvolvimento. Na esquerda não faltam os que, de uma forma mais ou menos clara, defendem a ditadura do proletariado como o modelo político capaz de gerar progresso e justiça social. A ditadura tinha os seus planos de fomento, da mesma forma que a URSS tinha os planos quinquenais, os objectivos económicos pressupunham uma decisão à margem de qualquer decisão democrática. Se antes do 25 de Abril a propaganda do regime não se cansava de exibir o seu sucesso, depois do 25 de Abril todos tivemos a oportunidade de ver em revistas como a “Vida Soviética” ou a “Sputnik”, as realizações económicas, tecnológicas e sociais conseguidas graças à ditadura do proletariado.

Manuela Ferreira Leite poderá ter sido irónica ao propor a suspensão da democracia durante uns tempos, mas quando afirmou sem qualquer ironia que não acreditava em reformas em democracia estava a dizer que para ela a democracia é menos eficaz do que a ditadura. Não me surpreendeu, Manuela Ferreira Leite faz parte de um grupo de economistas que sempre se identificaram, em maior ou menor grau, com a corrente dos monetaristas de Milton Friedman, os chamados Chicago’s boys. Ora, um dos grandes “sucessos” económicos dos Chigago Boys foi precisamente a ditadura de Augusto Pinochet, as reformas então empreendidas graças a uma das mais ferozes ditaduras foi para uma boa parte da direita mundial o argumento para a condescendência com que viam a ditadura chilena. Coincidência, ou talvez não, as declarações foram proferidas na Câmara de Comércio Luso-Americana, o que significa que para além de ser descuidada, Manuela Ferreira Leite não deu pela mudança que está a ocorrer na América.

A verdade é que muitos “democratas” que não calaram a sua indignação partilham da mesma falta de convicção nas virtudes na democracia que Manuela Ferreira Leite manifestou ao afirmar que não acreditava na possibilidade de implementar reformas em democracia, ainda que goste de recordar as reformas empreendidas durante os governos de Cavaco Silva. Em Portugal há três tipos de democratas, os que acreditam na democracia, os que preferem a democracia com receio de uma ditadura de sentido inverso à que desejam e os que consideram a democracia o regime que cria melhores condições com a sua estratégia de alcançar uma ditaudra.

Passada a onda de choque provocada pelas declarações de Manuela Ferreira Leite, onde se misturou a ironia mal expressa e a falta de confiança na democracia, subsiste a questão de fundo que foi suscitada, saber se a democracia é capaz gerar mais desenvolvimento do que a ditadura. Compreende-se que o debate tenha morrido cedo, muitos dos que se indignaram com as declarações de Manuela Ferreira Leite não só partilham da sua descrença nas virtudes da democracia, como não precisam de qualquer ironia para serem defensores da ditadura a título definitivo.

Não faltam por cá os que elegem Salazar como a personalidade do século XX português, ou os que encontram motivos de admiração no regime da Coreia do Norte.

Em todos os momentos de crise nacional sempre houve quem duvidasse da democracia e acenasse com as falsas virtudes da ditadura. E se o regime político resvalasse para uma ditadura veríamos como não faltariam aderentes, nem sequer faltariam os defensores de Pinochet que adeririam a uma ditadura do proletariado, nem os que sonham com o comunismo que adeririam a uma ditadura da direita. É a ditadura que unem os que duvidam da democracia.

Basta ver como uma boa parte dos nossos políticos são dados a soluções do tipo caudilhista para o perceber.