Ou estou muito enganado ou a mania do bio-combustível vai sair caro à Europa e ao mundo, os custos ambientais e o aumento da fome serão custos bem mais elevados do que os ganhos ambientais resultantes da moda do bio-combustível.
As empresas do sector agro-alimentar já estão a alertar para o provável aumento dos preços e desta vez não estamos perante aumentos oportunistas. As empresas que se abastecem de cereais e arroz já estão a sentir dificuldades de abastecimento, a constituição de stocks é o primeiro objectivo relegando para segundo plano os preços.
Os milhões de toneladas de cereais que serão desviados para a produção de bio-combustível serão em parte desviados do consumo humano ou produzidas à custa do aumento da produção. Isto significa um aumento dos preços em consequência do aumento da procura deste produto. Em consequência todos os produtos que usam cereais como matérias-primas serão penalizados nos preços. Estamos a falar do pão e das carnes que o comum dos cidadãos identificam com os cereais, mas estamos também a falar de milhares de outros produtos que usam cereais ou transformados de cereais como matérias-primas como, por exemplo, a cerveja (gritz), o vestuário (colas à base de amidos modificados), os antibióticos (amido) e centenas de outros produtos.
O aumento da produção de cerais significa que serão usados milhões de toneladas de químicos e fertilizantes, que irão parar às águas. Significa que haverá uma maior pressão para a desflorestação com vista a obter terrenos para culturas que serão altamente rentáveis, principalmente nos países do terceiro mundo. Significa que muitas populações terão dificuldades em aceder a alimentos básicos como mandioca (cujo preço acompanha os cereais), o arroz, o trigo ou o milho. Uma boa parte do que se ganha em redução do CO2 será perdido pela desflorestação ou pela poluição resultante da utilização de produtos químicos.
Estamos perante um efeito perverso da famosa globalização, o Ocidente promove o crescimento sem regras de países como a China que aumentam exponencialmente o lançamento de CO2 na atmosfera, exercem pressão sobre o mercado do petróleo levando o preço a níveis inimagináveis. O aumento do CO2 pressiona o Ocidente na busca de soluções e o aumento do preço viabiliza economicamente outras soluções energéticas, desde a exploração de jazidas de petróleo que tinha deixado de ser rentáveis à produção de combustíveis alternativos.
O preço elevado do bio-combustível e o próprio aumento dos custos salariais, pressionados pelos preços dos produtos alimentares, tornarão os preços dos produtos do Oriente ainda mais competitivos, de onde resultará um aumento do consumo (ineficaz) do petróleo e da quantidade de CO2 lançado na atmosfera. Não tardará muito para que os preços dos cereais cotados nas bolsas de mercadorias (Chicago) comecem a reflectir a situação do mercado dos produtos petrolíferos, e veremos o que vai suceder quando o preço do pão acompanhar o da gasolina.
Esperemos que a solução do bio-combustível, uma solução política e ecologicamente correcta, não se venha a revelar a bio-estupidez do século. Esperemos que dentro de pouco tempo não façam manifestações contra a destruição da vida selvagem, a desflorestação e a fome pois estas serão as consequências evidentes deste aumento irracional da produção de cereais. Depois ainda irão descobrir que os cereais são um grande negócio de multinacionais que têm muito a lucrar com o negócio das sementes, dos químicos, dos fertilizantes e dos cereais.