Não admira que Portugal não consiga eliminar as assimetrias na distribuição de riqueza, havendo mesmo períodos em que estas se agravam, o nosso modelo económicos alimenta-se e alimenta a pobreza ao centrar a produtividade nos baixos salários. Quando a economia cresce multiplicam-se os apelos à contenção salarial, quando se enfrenta a crise o congelamento salarial é a norma. Veja-se, a título de exemplo, a posição assumida por Manuela Ferreira Leite e uma desconhecida associação de pequenos empresários (coincidências) a propósito do recente aumento do salário mínimo nacional, que em termos europeus é miserável.
Este modelo está esgotado e falido, não só favorece as empresas e os modelos de gestão menos competitivos, como empobrece o mercado interno impedindo o desenvolvimento de iniciativas empresariais que não dependam do mercado externo. Do mercado interno vivem as petrolíferas, a energia, o sector agro-alimentar, as telecomunicações e pouco mais. Se a estes sectores juntarmos o Estado e a banca temos quase toda a actividade económica. Dependentes da ineficácia do Estado, das altas taxas de juro da banca, dos elevados custos da energia e das telecomunicações estão quase todas as outras empresas que para sobreviverem dependem do mercado externo.
Este paradigma tem de ser invertido, em vez de se afirmar que para a economia crescer os salários deverão ser baixos é preciso evoluir para um modelo em que o aumento dos rendimentos dos portugueses é gerador de crescimento económico.
Só que esta mudança não se opera por decreto, nem pode ser confundido com as tradicionais exigências sindicais, exige um esforço colectivo, é preciso trabalhar mais, melhor e com mais qualificações. Pagar mais sim, mas para isso é necessário que se trabalhe mais e melhor, dependendo isto tanto dos métodos de gestão e da inovação das empresas, como da prestação e qualificação dos trabalhadores.
Esta mudança implica uma revolução, quer pela resistência de empresários com uma mentalidade herdada do tempo do condicionamento industrial e do salazarismo, quer pela oposição de sindicatos cada vez mais corporativos e empenhados em proteger as mordomias dos milhares de sindicalistas que há muitos anos que se esqueceram das suas profissões.
Esta mudança implica que se conclua de uma vez por todas que a nossa pobreza não resulta apenas da má distribuição da riqueza, resulta também da pouca riqueza que se produz e que para produzir mais riqueza será necessário produzir mais e melhor e produzir mais e melhor não se consegue com iniciativas como o “dia do trabalho nacional”.
Remunerar melhor pressupõe também produzir melhor e para o fazer precisamos de melhores escolas, de melhores professores, de melhores funcionários públicos, de melhores operários, de melhores gestores, de melhores políticos. É preciso acabar com a cultura da mediania e com uma mentalidade em que em vez de se discutir como produzir mais passa-se o tempo a descobrir fórmulas milagrosas para enriquecer com o pouco que se produz.
O país precisa de uma revolução cultural que ponha fim a discussões inúteis, que reforme políticos incompetentes, que leve à falência empresários sem escrúpulos, que dinamize a concorrência, que privilegie a excelência em vez da mediania, que estimule a ambição, que ponha fim a um ciclo histórico de pobreza material e cultural.
O nosso problema não está apenas em saber como distribuir melhor a riqueza, mas também em saber como criar melhor riqueza e os dois problemas estão associados, para produzir mais será necessário distribuir melhor, mas para distribuir com justiça será necessário produzir riqueza de forma mais eficiente.
QUer a esquerda, quer a direita, mas mais a esquerda do que a direita, preocupam-se pouco com a produção de riqueza e tendem a encontrar a solução para todos os males na sua distribuição. Até os comunistas que em tempos tentaram demonstrar que o modelo de economia planificada seria mais eficaz do que o mercado para produzir riqueza de forma eficiente já centram a solução na distribuição, como se falar em produção fosse politicamente inaceitável, o que se compreende, isso implica questionar a produtividade das empresas.
O país tem um problema na distribuição do rendimento mas tem um outro bem maior e mais complexo que é produzir riqueza insuficiente para assegurar a todos os portugueses os níveis de bem-estar que todos os políticos propõem. Se assim é, porque razão se fala tão pouco em produzir?