Agora que finalmente se percebeu que a solução dos problemas do país se situa (também e principalmente) na correcção do desequilíbrio externo a nossa classe política quase deixou de falar de défice orçamental para repetir até à exaustão as palavras produtividade e competitividade, termos que estavam reservados para parágrafos de ocasião nos programas eleitorais e de governo. Ainda assim é pouco, confundem-se os dois conceitos e tende-se a reduzir o problema da sobrevivência do nosso tecido empresarial a soluções simplistas, com se tudo dependesse dos custos salariais ou, como sugere a mais recente ideia de Sócrates, à qualidade do trabalho. Nem os custos de produção se reduzem aos dos salários dos trabalhadores, nem a produtividade depende apenas da intensidade do seu trabalho, nem a colocação dos produtos no mercado externo depende em exclusivo dos seus preços.
Vista de uma forma simplória a produtividade pode ser medida com base nos custos de produção e é evidente que quanto menos custar um factor de produção mais produtiva parecerá ser uma empresa. Os trabalhadores até poderão produzir menos, se os custos salariais forem reduzidos mais do que proporcionalmente à redução da produção a produtividade aumentará, pelo menos aparentemente. Significa isto que uma empresa que devido à má gestão é menos produtiva pode apresentar níveis de produtividade crescentes.
É verdade que a preocupação de qualquer gestor é reduzir os custos de produção, mas estes não se limitam aos custos salariais por mais significativos que estes sejam, da mesma forma que a redução dos custos salariais não implica necessariamente a redução dos salários, pode e deve ser conseguida também com uma utilização mais eficiente do factor trabalho, recorrendo a melhores métodos de gestão, a tecnologias mais produtivas, etc.. Só que vivemos num país onde os trabalhadores são melhor qualificados do que os empresários, como demonstrou um estudo cujas conclusões foram divulgadas há poucos dias.
A competitividade é um conceito muito mais abrangente do que a produtividade e resulta de uma grande variedade de factores, factores que serão ainda mais complexos se falarmos em competitividade externa pois neste caso não basta vender barato, é preciso saber vender e encontrar no mercado externo quem nos pode comprar. Já aqui defendi muitas vezes que dificilmente as nossas empresas serão competitivas se no mercado interna não existir uma cultura de concorrência, como é o caso. O nosso mercado não favorece as empresas competitivas e não estimula a sua capacidade competitiva, numa economia onde 25% da sua actividade é feita à margem das regras, onde o Estado é o grande cliente e onde é mais fácil conseguir um bom negócio lambuzando uma classe política instalada sobrevivem os oportunistas em detrimento dos competitivos. É por isso que as empresas mais badaladas e bem sucedidas não são as exportadoras, são as que se especializam no consumo interno, nas compras do Estado e nas Obras públicas. É por isso que em vez de nascerem exportadoras nas imediações das novas auto-estradas são os centros comerciais que se multiplicam como cogumelos.
Reduzir o debate da competitividade aos custos salariais, tentando com cortes salariais ou com a indexação dos salários à produtividade de alguns não passa de uma mezinha que tratará dos sintomas da doença para que se evite tratá-la a sério. Se queremos competitividade teremos de mudar substancialmente em domínios que vão das apostas do Estado no domínio das infra-estruturas, da promoção de novas qualificações profissionais, no combate à corrupção, na redução dos custos parasitas criados pelo Estado para alimentar as suas mordomias, na criação de condições favoráveis à constituição de empresas e ao investimento tecnológico.
Confundir produtividade com redução de custos salariais e esta com competitividade significa que estamos a iludir o problema e continuamos a centrar a sobrevivência da economia na lógica dos sectores de mão de obra intensiva, isto é, significa repetir os erros que o país comete desde há décadas.