No meio de tanta afirmação contraditória sobre um eventual pedido de ajuda ao FMI, de livre iniciativa ou imposto por Bruxelas, começa a ser confuso perceber quem quer e quem não quer a preciosa ajuda internacional, o mesmo é dizer que interesses estão defendendo os que querem ou não querem tal ajuda.
Os banqueiros dizem que não querem pois aposta na passagem do temporal especulativo e contam com a retoma da economia para animar os negócios, entretanto têm muito a ganhar com o diferencial existente entre os juros exigidos pelo BCE e os que cobram aos Estados Europeus cuja dívida soberana atingiu juros absurdos. Mas se a situação financeira do país se degradar é certo que vão ser os primeiros a apelar a Sócrates que recorra à ajuda internacional.
Sócrates não quererá recorrer ao FMI pois isso seria o reconhecer ter cometido erros na política orçamental o que sendo evidente não seria notícia noutro contexto económico internacional. Os erros cometidos por este governo foram ensinados por um conhecido professor de economia, há muito que os governos tornaram a execução orçamental num domínio de total opacidade. Mas se a crise financeira atingir a Espanha e a Itália, o que começa a ser muito provável, Sócrates poderá beneficiar de uma mudança de posição da Alemanha ou usar a crise nestes países para justificar um recurso à ajuda internacional, se até os ricos são obrigados a recorrer é porque o mal não é nosso.
A posição mais hipócrita tem sido a protagonizada por Pedro Passos Coelho que disputa o poder com a mesma leviandade com que disputaria a associação de estudantes de uma escola do ensino preparatório. Num dia afirma o seu empenho na estabilidade e na independência do país, no outro quer que venha o FMI e já diz aos portugueses que precisa de duas legislaturas, tudo depende das sondagens.
Esta hipocrisia ficou evidente na discussão do OE em que se limitou a promover a instabilidade política contando com o aumento dos juros como um reforço do seu poder negocial. Depois de conseguir aumentar os juros da dívida soberana limitou-se a fazer um simulacro de negociação da qual resultou o aumento da despesa e uma importante conquista orçamental para os portugueses, a manutenção da taxa do iva nos refrigerantes.
Agora que voltou a estar bem na sondagens volta a dar uma ajuda aos especuladores e já admite a vinda do FMI, até admite governar com o FMI, só não explica se vai ser convidado para primeiro-ministro por Cavaco Silva ou pelo presidente do FMI pois dificilmente a estabilidade nos mercados financeiros vai durar os meses que terá de esperar até que se realizem eleições legislativas. Se Passos Coelho dispõe-se a governar com o FMI resta saber se o fundo está disponível para governar com Passos Coelho, um político que aprova um orçamento para evitar a vinda do FMI e uma semana depois quase convida o FMI a vir é muito pouco credível quer para o FMI, quer para os investidores.
O mais grave é que enquanto os portugueses discutem se o país precisa da ajuda do FMI o líder do PSD equaciona o problema noutra perspectiva, Passos Coelho acha que o FMI pode vir a ajudá-lo. De uma negociação com o FMI resultam duas coisas, ajuda financeira como contrapartida de um pacote de medidas políticas, o cinismo oportunista de Passos Coelho leva-o a pensar que divide a coisa ao meio a ajuda financeira é para o país e as medidas políticas constituem uma ajuda ao seu projecto político, conseguirá com a chantagem do FMI impor ao país um projecto político que quando foi assumido o levou a cair abruptamente nas sondagens. Pedro Passos Coelho espera que o FMI force os portugueses a aceitar entre outras coisas o seu projecto de revisão constitucional.
Enquanto em vários países europeus cidadãos e governos discutem a bondade ou necessidade de recurso à ajuda internacional, em Portugal as diversas forças estão a equacionar o recurso ao FMI mais para ajudar os benefícios financeiros e políticos de cada um do que os que resultariam para o país.