Se nos abstrairmos da suposta seriedade dos argumentos ou das preferências partidárias o que sobressai daquilo a que se tem assistido em torno das eleições europeia é o seu lado miserável, é o facto de a miséria humana ser tanta que a ganância fica mais à vista. Se por um lado estas são eleições onde os temas políticos se apresentam como mais elegantes, a verdade é que o que se evidencia nos movimentos em torno destas eleições é a ganância de uma classe política em busca de dinheiro fácil.
São lugares nas listas a funcionar como recompensa por serviços prestados aos senhores da guerra da nossa política, é a compra de potenciais candidatos alternativos à actuais lideranças. Nalguns casos as manobras da graxa, das supostas aproximações, das manifestações de disponibilidade já duram há meses, não admira as dificuldades de alguns partidos em apresentarem as listas num calendário lógico.
Nem a extrema-esquerda fugiu ao poder da sedução do conforto europeu, tradicionalmente anti-europeista já o deixou de ser pois não faz muito sentido ser contra uma Europa que consegue juntar toda a sua extrema-esquerda em Bruxelas. Sem Europa a nossa esquerda conservadora seria quase exclusivamente doméstica. Aliás, foi na esquerda conservadora que assistiu aos espectáculos mais divertidos e hipócritas, com muitas personalidades a descobrirem nas eleições europeias a oportunidade de criarem os seus próprio partidos para se fazerem eleger para Estrasburgo em nome da unidade da esquerda.
Mas é óbvio que nem Assis, nem Rangel nem nenhum dos candidatos já eleitos muito antes das eleições assume que o que os move é um bom taxo, bem remunerado, com boas ajudas de custos e óptimas instalações parlamentares. Quem os ouve corre um sério risco de acreditar que vão mesmo salvar a Europa e, através desta, livrar o país da sarna da troika.
A coisa é tão pouca séria que o pequeno Rangel, agora numa versão mais elegante e com a barba mais aparada, decidiu dar asas à sua imaginação e considerou que cada item do seu programa feito à pressa era um latido de cada um dos “101 Dálmatas”. Outro rapazola que a natureza zipou, desta vez o líder do grupo parlamentar, achou piada à lógica europeia do Rangel e apelidou os deputados do parlamento português como os soldados do Rangel nesta batalha. Estamos que estamos a brincar às batalhas medievais, os candidatos são os nobres que se apresentam em garbosos cavalos brancos e ficam cá atrás a assistir, para tropa de choque servem os soldadinhos de chumbo do parlamento dos baixos salários. Enfim, a direita é coerente nos seus valores e não esconde o desprezo pelos que são mais mal remunerados.
E o que dizer de um garboso político de que um jornal dizia que não se importava de passar de número dois a número um da lista? Como o compreendo, pela forma como se tem cortado brutalmente no meu vencimento, com a concordância e apoio moral desse deputado até eu aceitava ir para o parlamento no último lugar elegível de qualquer um dos partidos.