Um dos dogmas em que assenta o marxismo-leninismo reside em considerar a classe operária como a vanguarda do proletariado, uma classe com o dom da pureza, a única capaz de garantir o respeito da pureza ideológica. Os operários são uma espécie de virgens Marias do leninismo, só eles têm o dom da pureza capaz de gerar aquele que nos levará ao paraíso.
Este princípio é tão respeitado que quando ocorreu a revolução chinesa os ideólogos europeus do marxismo-leninismo defendiam que a implantação do comunismo na Cinha estaria condenada ao insucesso por ser liderada pelo proletariado agrícola. Por cá esse debate ainda se fazia sentir nos anos setenta.
Quando Jerónimo de Sousa chegou a líder do PCP uma qualidade que lhe foi realçada foi precisamente a sua condição de operário metalúrgico e hoje, ainda que ele já não exerça a profissão há várias décadas ainda é apresentado como operário. Curiosamente, ao elogiar-se a condição de operário de Jerónimo de Sousa esconde-se que os anteriores dois líderes do PCP eram oriundos da burguesia, talvez por isso se fale tão pouco das origens familiares do idolatrado Cunhal, o líder que ainda hoje é envolvido por um culto da personalidade digno do Santo António.
Quem analisar os movimentos grevistas dos dias de hoje constata algo de curioso, são muito raras as greves conduzidas pela chamada classe operária e o esforço do PCP no sentido de promover alguma agitação social concentra-se nos sindicatos da Função Pública e, pecado leninista digno do purgatório, nos sindicatos das forças policiais. Isto é, o movimento operário quase desapareceu e o que anima o marxismo-leninismo português, seja o assumido ou o disfarçado e contaminado pelo trotskismo ou pelo maoismo, são aqueles que no passado estavam do lado do capitalismo.
Seria interessante analisar as manifestações do 1.º de Maio promovidas pela CGTP à luz dos conceitos do marxismo-leninismo e avaliar até que ponto o comunismo terá de rever os seus dogmas à luz de uma realidade que ele próprio molda numa tentativa de se adaptar a um mundo que se lhe escapa. A classe operária é ainda a vanguarda do proletariado que nos conduzirá pelo caminho das pedras até ao comunismo.