quinta-feira, dezembro 10, 2009

Dualismo


Um dos sinais mais preocupantes da evolução da economia portuguesa é o dualismo, podendo este ser entendido segundo diversas abordagens ainda que na sua origem possam estar as mesmas causas. Este dualismo crescente manifesta-se nas assimetrias na distribuição do rendimento, nas diferenças entre interior e litoral e mesmo entre as cidades do interior e o meio rural e até mesmo nas diferenças de rendimentos entre diversos grupos profissionais.

O modelo socialmente estratificado herdado do Estado novo sobreviveu ao pós o 25 de Abril e com a entrada na CEE deu lugar a uma mudança social acelerada com as consequências que estão à vista. A imensidão dos fundos comunitários foram generosamente distribuídos por algumas regiões e grupos profissionais, criando novas classes de ricos e endinheirados. Algumas políticas comunitárias, como é o caso da Política Agrícola Comum, geraram efeitos perversos, acelerando a desestruturação social do meio rural e do interior em geral.

O sucessivos governos têm fortes responsabilidades neste processo que apesar de aparentar um aumento de riqueza tem gerado o empobrecimento relativo do país, a desintegração de culturas e até mesmo o estilhaçar do conceito de Nação, que está agora quase reduzido ao aplauso dos golos do Liedson. A combinação da ignorância popular com o oportunismo eleitoral deu lugar a uma governação feita a pensar nas eleições, deixando de se questionar o rumo do país, até o mais conhecido dos nossos timoneiros, o senhor Silva que agora está em Belém, ocupava o último trimestres dos seus mandatos a inaugurar as obras que mandou construir com os dinheiros comunitários, era o tempo do oásis e da democracia de sucesso, um tempo em que todos os que ousassem discordar eram acusados de serem forças de obstrução.

O objectivo das elites deixou de ser o país, cada grupo reivindica os meios necessários para comprar o BMW e ir de férias para Punta Cana, uma boa parte do debate nacional esconde a inveja e a disputa pelo dinheiro fácil gerado por um modelo económico e social que esquece os mais pobres. O que move uma boa parte das nossas elites não são os problemas do país mas sim a disputa por um lugar melhor junto à manjedoura, uns querem mais acesso a subsídios, outros falam mal da desgraça nacional na esperança de ganharem um bom contrato de consultadoria, outros incriminam os políticos na esperança de o próximo governo lhes aumentar as mordomias a troca da tranquilidade e dos jornais sem acesso ao segredo de justiça. Até já vi um Saldanha Sanches defender que o Marcelo não devia emitir pareceres…

Receio que uma boa parte dos debates a que vou assistindo nada tenham que ver com os problemas e muito menos com a preocupação com os muitos portugueses que estão marginalizados do acesso à riqueza e bem-estar. Assisto a uma luta despudorada pela distribuição da riqueza fácil, a manifestações de inveja em relação a todo e qualquer um que apresente sinais exteriores de riqueza, a uma mesquinhez colectiva de argumentos e propostas. Os que fazem propostas motivadas pela inveja, os que querem destruir a democracia promovendo falsos sonhos, os que detestam uma democracia que não os elege estão como peixes na água neste imenso aquário cada vez mais turvo.