«"Hoje é assunto de que não devemos falar. Temos aqui cerca de 50 jovens chefes de cozinha e que eu fiz questão de, na pessoa deles, homenagear a gastronomia portuguesa e ajudar a projetar essa gastronomia por esse mundo fora", afirmou Cavaco Silva, em declarações aos jornalistas no Palácio de Belém.» [Diário Económico]
Foi nestes termos que Cavaco Silva evitou comentar o negócio da Vivo, isto é, entre falar do maior negócio da economia portuguesa das últimas décadas o presidente da República optou por dizer aos portugueses que está tentando salvar o país vendendo pastéis de bacalhau aos esquimós.
É evidente que Cavaco deve evitar falar de negócios, mesmo quando esteja em causa uma decisão governamental que tenha por consequência a sua não realização, é também evidente que o inventor nacional das golden shares se sinta incomodado com tema quando se sabe que o líder do seu partido falou dessas golden shares como se tivessem sido uma invenção do PS. Só que por um negócio de muito menor dimensão, a tentativa de compra da Media Capital pela PT, Cavaco não só falou como falou demais.
A diferença entre o negócio da Vivo e o negócio da Media Capital é evidente, no primeiro poderia estar em causa o interesse nacional, no segundo estavam em causa interesses político-partidários, no caso da Vivo eram os accionistas que queriam vender, no caso da Media Capital eram os cavaquistas do PSD que receavam a venda. A conclusão é óbvia, quando estavam em causa as estratégias políticas de Manuela Ferreira Leite que via no trabalho de Manuela Moura Guedes a sua sobrevivência política Cavaco não perdeu tempo a tomar posição, agora que está em causa o interesse do país o presidente da República descobre que este interesse reside nos pastéis de bacalhau.
O país fica com a impressão que quando espera que Cavaco fale este fica calado e quando acha que este deve ficar calado o presidente decide falar. Devia ter ficado calado na questão das escutas mas falou de forma lamentável em plena campanha eleitoral, devia ter ficado calado em relação ao processo BPN e falou para defender o seu amigo Dias Loureiro, devia ter ficado calado quando promulgou o casamento gay e falou de economia. Por outro lado, quando se espera que Cavaco fale a resposta é sempre um “não posso comentar”.
Mas pior do que comentar ou não comentar é a total ausência de grandeza dos argumentos que usa, um presidente da República não pode justificar que não está presente nas cerimónias fúnebres de um prémio Nobel da Literatura dizendo que vai mostrar os Açores aos netinhos ou já tem o cozido no fogão, da mesma forma que não pode dizer que está mais preocupado em vender pastéis de bacalhau do que com o negócio da Vivo, isto é um país, não é a mercearia e bomba de gasolina para bicicletas a motor de Boliqueime.