Independentemente da opinião que se possa ter sobre o assunto vale a pena ver o que se vai dizendo e escrevendo sobre a possibilidade de os mais ricos darem o seu contributo para combater a crise, uma hipótese que nem sequer tinha sido colocada em Portugal, um dos países em dificuldades.
Compare-se, por exemplo, as reacções dos comentadores económicos quando Vítor Gaspar divulgou as medidas “brutais” da sua política económica “robusta” com os comentários escritos com punhos de renda que fazem quando se coloca a hipótese de as medidas atingirem os rendimentos dos mais ricos. Quando as medidas atingiram a classe média e os mais pobres o ministro das Finanças foi eleito para herói, agora desdobram-se em explicações de como os ricos já pagam ou deve ficar de fora.
Tristemente o melhor exemplo desta abordagem é-nos dada por Cavaco Silva, quando Sócrates governava condicionava a política económica com o argumento de que haviam limites para os sacrifícios dos mais desfavorecidos sem que alguma vez tenha defendido que tais sacrifícios deveriam ser partilhados por todos os portugueses. Agora que todos se pronunciaram sobre o assunto lá veio dizer que não inviabilizaria medidas que atingissem os ricos desde que não condicionassem o crescimento.
O raciocínio de Cavaco assenta no pressuposto sacana que ao longo dos anos condicionou a política económica deste país, o dinheiro dos ricos é capital enquanto o dinheiro dos pobres é desperdício, o dinheiro dos primeiros é indispensável ao crescimento enquanto o dinheiro dos segundos é mal gasto e causa das crises.
Outra mentira que está a ser propalada é a de que os ricos já foram chamados a participar ao sacrifício por via do IRS, até porque pagam taxas substancialmente superiores, só que se esquecem de dizer que que muitos rendimentos não são tributados em sede de IRS, em limite Américo Amorim ou Belmiro de Azevedo podem apresentar uma declaração de rendimentos de IRS idêntica à dos seus empegados pior remunerados.
Américo Amorim ganhou dezenas de milhões de euros quando foi encontrado petróleo no Brasil e as suas acções na GALP foram valorizadas, mas não pagou um único tostão em impostos. Mas se um pobre decidir vender a sua casa e esta tiver um valor superior ao que tinha tido no momento da compra terá de pagar mais-valias.
Limitar os sacrifícios ao IRS, como parecem defender muitos incluindo Cavaco, é uma sacanice, eles sabem que os rendimentos da classe média e das classes mais pobres são tributados na sua totalidade em sede de IRS. Mas nos caso dos mais ricos o IRS incide sobre apenas parte dos seus rendimentos e na maior parte dos casos não é mais do que simbólico.