Supostamente as secretas deveriam servir para velar pela segurança nacional e se os inimigos externos dessa mesma segurança nacional são mais ou menos fáceis de catalogar, já os inimigos internos deixa margem para muita dúvida. Se os negócios privados de um administrador de uma televisão ou o trabalho de um jornalista que faz publicar notícias que respeitam os parâmetros estabelecidos pela lei de imprensa poem em causa a dita segurança nacional então temos que concluir que todos os portugueses, por um qualquer motivo, podem catalogar-se na classe dos inimigos internos. Quem nos garante que o varredor dos serviços camarários que varre a Rua da Imprensa à Estrela, onde se situa a residência oficial do primeiro-ministro, não é um perigoso espião ao serviço da al-Qaeda que tem por função registar os horários de Passos Coelho.
Nos últimos dias percebemos também que se pode espiar o administrador de uma empresa para depois ir entregar a informação assim obtida a um concorrente dessa empresa, no caso é a Ongoig que quer abocanhar a RTP de onde resultarão prejuízos potenciais para a TVI, para além de a mesma Onoing ser uma importante participante no capital da Impresa, proprietária da SIC e por enquanto a grande concorrente da mesma TVI. Que utilidade teria tal informação para a Ongoing? Para ganhar vantagens competitivas, para fazer chantagem sobre o visado ou para o prejudicar? Não sabemos se existiram ganhos em negócios ou se foi feita qualquer chantagem, mas soube-se pela comunicação social que alguém ligado à Onoing usou tal informação de forma insidiosa para impedir Bairrão de fazer parte do Governo, sendo evidente que a Ongoig não queria no Governo alguém ligado à TVI e muito menos num ministério ligado à segurança.
Quando este caso ocorreu ouviram-se uns guinchinhos de indignação mas a coisa ficou por aí, ninguém chamou o responsável das secretas a São Bento nem se pediu uma investigação profunda, como agora sucedeu no caso do jornalista. Ainda que a diferença seja nula pois em ambas as situações tudo vai ficar em águas de bacalhau, vale a pena comparar e registar a diferença de reacções.
A questão que se coloca é saber até que ponto as secretas não têm sido usadas para obter vantagens nos negócios ou na política e se em pouco tempo se teve conhecimento de dois casos evidentes de abuso não é difícil de imaginar que poderemos não estar perante situações de excepção.
É evidente que as secretas actuam nos limites da legalidade, ninguém imagina que tendo conhecimento da entrada em Portugal de um perigoso terrorista a secreta vá acordar o juiz da comarca de Vilar Formoso para lhe solicitar autorização para proceder a escutas às comunicações telefónicas do suspeito de terrorista. Ninguém imagina que depois de obtida tal autorização aguarde pela segunda-feira para se dirigir às operadoras para que procedam à intercepção e gravação das conversas telefónicas. Se assim fosse quando o processo legal estivesse concluído já o terrorista teria estoirado com a Quinta da Coelha e estaria a bronzear-se calmamente nas praias de Torremolinos.
O problema é que os recursos que servem para perseguir e espiar um terrorista também permitem conhecer os pequenos podres de um adversário político para depois o derrubar, ou para conhecer os negócios de um grande banqueiro para depois se ganharem milhões na bolsa. A regra é partir-se do princípio de que os que dirigem e trabalham nas secretas são possuidores de alguma autonomia em relação ao poder político e que têm uma formação democrática acima de qualquer suspeita. Ora, é evidente que não parecem ter nem uma coisa nem a outras, as manobras de bastidores para controlar as secretas são notícias dos jornais e pelos dois casos revelados pela imprensa deverão ter menos vocação e formação democrática do que tinha um vulgar agente da PIDE.
E se os meios e liberdade para investigar o tal terrorista que pode entrar por Vilar Formoso são necessários nada nos garante que quando o tal personagem entrar os nossos agentes secretos em vez de o investigarem estão ocupados a vasculhar a alcofa de um jornalista ou a recolher informação para os amigos da Onoing. Se assim é não estão avelar pela segurança nacional e os contribuintes estão a ganhar dinheiro para enriquecer ainda mais o senhor da Ongoing, isto depois de ter andado a pagar o subsídio de doença da Manuela Moura Guedes durante quase um ano. Se assim é o melhor é fechar as secretas, depois da preocupação com as gorduras do Estado talvez seja tempo para combater também o colesterol desse mesmo Estado.
PS: Se os senhores das secretas quiserem investigar este humilde palheiro façam um favor aos contribuintes, em vez de fazerem como nos filmes poupem na despesa e batam à porta.