quarta-feira, agosto 06, 2014

O BdP mau e o BdP bom

Ainda sou do tempo em que o Banco de Portugal era mais do que a miragem de reformas douradas para serventuários do poder em fim de carreira, durante décadas o BdP sobreviveu a regimes e a crises, era uma entidade respeitável em que os cidadãos confiavam. A palavra de um governador do Banco de Portugal como o Prof. Jacinto Nunes, recentemente falecido, era inquestionável, estava dito, era como a palavra dada num negócio à moda antiga.
  
Desde que o mérito deixou de ser uma condição necessária para se chegar a governador do Banco de Portugal e os lugares de administradores começou a ser ocupado por personagens menores que apenas desejam obter uma pensão dourada o banco começou a ser um instrumento ao serviço dos governos. Os governadores passaram a ser apoiantes da política económica adoptada pelos governos e usam o prestígio da instituição para validar tudo o que qualquer ministro das Finanças decide.
  
O processo BES exibiu um governador do Banco de Portugal titubeante, incapaz de tomar uma decisão e que durante semanas enganou accionistas e clientes do BES fazendo afirmações que hoje se sabe não terem correspondido nem de perto, nem de longe à verdade. Como é que se pode confiar num governador que inventou almofadas e investidores estrangeiros, que num dia vendia confiança aos accionistas e clientes e no outro dia selecionou uns para salvar e outros para serem lixo? Como se pode confiar um governador que faz uma comunicação ao país quase à meia-noite de um domingo quando na véspera Marques Mendes disse tudo o que ele ia dizer?
  
No passado havia em Portugal um Banco de Portugal bom, gerido por gente com habilitações e dimensão humana inquestionável, gente cuja palavra era inquestionável e que inspirava confiança aos agentes económicos. Aquilo que o país tem hoje é um Banco de Portugal mau, um governador cujas declarações são tóxicas e perigosas para quem nelas confia.
  
O Presidente é o que se sabe, o governo mente todos os dias, o governador é o que sabe, os tribunais decidem com uma década de atraso. Em quem podem os portugueses confiar? Qual o investidor estrangeiro que investe num país onde Banco de Portugal e CMVM dão cobertura a um aumento de capital de mais de mil milhões que depois é roubado, onde os tribunais levam dez anos a decidir um processo, onde a comunicação é comprada, onde os presidentes dos partidos recebem gorjetas avençadas, onde nem o governo nem o Presidente dão a cara pelas suas decisões, onde o Marques Mendes tem acesso a todos os segredos do poder e dá a conhecer algumas num programa de televisão onde é remunerado como comentador?
  
Se a exposição do BES ao GES levou à destruição do BES a exposição do país a tanta incompetência, oportunismo, cobardia e corrupção vai levar inevitavelmente à sua degradação, Portugal é cada vez menos um bom país e cada vez mais um mau país.