quinta-feira, março 19, 2009

Manifestações

Um post sobre manifestações começa obrigatoriamente por uma declaração de princípios, que do direito à manifestação é indispensável à democracia. É evidente que estou a falar em manifestações onde os cidadãos se podem manifestar contra o poder, sem serem sujeitos a qualquer forma de coacção. Digo que é evidente porque também há regimes políticos onde as manifestações são uma obrigação, são encenações melhor organizadas do que os desfiles das escolas de samba.

As manifestações são uma forma de um grupo de cidadãos, muito ou pouco numeroso, protestar, defender o que entendem ser os seus direitos, pressionar o poder a favor de uma reivindicação. Podem também servir para influenciar a opinião pública e é esse o caso de muitas das manifestações que ocorrem em Lisboa. Neste aspecto as manifestações têm evoluído. Já não se organizam manifestações para incomodar a população de Lisboa, lançando a confusão no trânsito, os nossos sindicalistas perceberam que era má estratégia. Agora as manifestações visam passar a mensagem na comunicação social, fazem-se manifestações a contar com editoriais do director do Público, com os orgasmos da Manuela Moura Guedes e até com os posts do Abrupto de Pacheco Pereira.

É por isso que agora a aposta é a organização de grandes manifestações, umas maiores de que as outras, tentando passar a mensagem de que a maioria dos portugueses estão com Carvalho da Silva. À legitimidade do Governo os organizadores das manifestações querem sobrepor a legitimidade da rua, o que já foi defendido explicitamente por Jerónimo de Sousa aquando da presentação da moção de censura ao Governo por ocasião da aprovação das alterações da legislação laboral. Nessa altura Jerónimo de Sousa disse que a moção que tinha sido reprovada no Parlamento tinha sido aprovada na rua, isto é, que a legitimidade das ruas se sobrepunha à legitimidade constitucional.

Confesso que gostei de ver a última manifestação da CGTP, foi bem organizada, foi ordeira, evitaram-se os cartazes rascas que marcaram as manifestações dos professores (enfim, no melhor pano cai a nódoa). Gosto de ver grandes manifestações, muitas das lutas políticas em Portugal tiveram expressão pela realização grandes manifestações, principalmente antes de o país entrar na normalidade constitucional.

Ora é neste ponto que discordo dos organizadores das grandes manifestações e alguns dos seus inesperados admiradores da direita, é que se a liberdade de manifestação é um direito sagrado da democracia muito mais sagrado é o recurso ao sufrágio universal para escolher quem nos governa e é bem mais fácil juntar umas dezenas de milhares de manifestantes do que conquistar a autarquia de Lisboa. Os manifestantes da CGTP era menos de metade dos eleitores do PCP e nem conto com os do BE e dos que dizem ter votado PS que curiosamente não apareceram na última manifestação.

Parece que anda por aí muita gente, incluindo alguns jornalistas mais zangados com Sócrates, que acham que as políticas de um país devem ser alteradas em função de manifestações, como se a vontade dos que vão ao Rossio tivesse mais valor dos que vão a votos. Por essa lógica eu não contaria para nada em democracia, já que não costumo participar em manifestações.

Isto significa Carvalho da Silva, alguma direita (principalmente os autarcas que emprestam os autocarros e o pessoal dos centros de dia) e até alguns defensores da cidadania têm um profundo desprezo por todos aqueles que não optam pela manifestação como forma de se manifestarem na vida pública.