Depois de ter permitido que o Palácio de Belém servisse de
sede de conspirações contra a democracia, depois de ter promovido o
conspirador, depois de ter ajudado a derrubar um governo do PS, depois de ter
permitido que o governo do seu partido ignorasse durante dois anos o líder da
oposição, depois de ter assistido a revisões sucessivas do memorando nas costas
dos portugueses e de um dos seus subscritores, depois de ter usado o discurso
do 25 de Abril para atacar o maior partido da oposição, Cavaco Silva acha que
ainda fez pouco e agora exige ao PS que apoie o seu governo. Compreende-se este ódio ao PS, os seus pesadelos estão cheios de personalidades do PS, como Soares ou Sócrates.
O que Cavaco propôs foi uma não solução, como diria o outro
esta plataforma cavaquista ( a persoonalidade independente deve ser o Catroga... ou a Ferreira Leite) não resolve coisíssima nenhuma. O que Cavaco fez foi um discurso redondo como uma melancia, o que propôs foi uma aberração
constitucional, sugere uma redução a título particular da legislatura, isto é,
as eleições antecipadas deixam de ocorrer devido a crises para resultarem de
acordos prévios, passam a ser eleições antecipadas a posteriori. O que Cavaco propôs foi pouco digno da democracia, não quer
ouvir os portugueses em eleições, mas em vez de negociar uma solução da crise
com os partidos faz discursos para atirar a populaça contra os partidos e
contra a democracia.
Já se sabia que o mês de Julho é uma desgraça quanto a
comunicações deste presidente, mas desta vez surpreendeu e fez ainda pior. O que Cavaco fez foi substituir uma
crise que tinha solução e aparentemente estava solucionada por uma crise da sua
iniciativa e que é aparentemente é insolucionável. O país já
sabia que tinha um governo incompetente e receava ter o mesmo problema na
presidência, a comunicação de Cavaco teve uma única virtude, a de esclarecer os
portugueses, agora sabemos que a presidência é tão incompetente quanto o
governo, Cavaco está para a presidência como o Álvaro está para o governo, a sua solução está para a crise política, como os pastéis de nata estão para a crise económica.
Depois de ter andado a prometer crescimento no segundo
semestre deste ano e de ainda há poucos dias ter garantido que a meta do défice
para 2013 era realizável, Cavaco vem prever a desgraça e conclui que isto só lá vai
se o PS se imolar na política do ministro das Finanças emérito Vítor Gaspar.
Depois de na semana passada ter garantido que os governos só respondem perante
o parlamento e de ter sugerido que os portugueses desconhecem a sua
Constituição, a mesma que o próprio Cavaco tem ignorado, vem agora propor uma
plataforma de salvação nacional que visa precisamente ignorar a Constituição substituindo-a por uma maioria constitucional.
Mas o que é a plataforma de salvação nacional? Não é nada, é
o mesmo governo, a mesma política, tudo igual como danes mas com o apoio parlamentar cego do PS para que os
diplomas mais sujos da democracia não tenham de passar pelo crivo do Tribunal
Constitucional. Com uma votação superior a dois terços o despedimento em massa
de funcionários públicos, a sua redução à condição de escravos, a destruição
dos seus direitos laborais entra em vigor sem qualquer incómodo incosntitucional. O que Cavaco
pretende já não é que o PSD governe com maioria absoluta, Cavaco quer forçar o
PS a votar favoravelmente tudo o que ele e Passos decidirem, isto é, quer que
os diplomas do seu governo tenham força constitucional. Cavaco sabe que o governo vai chumbar na 8ª avaliação da troika pois a sua refundação do Estado é constitucionalmente inaceitável.
Cavaco tenta dar o mais ridículo dos golpes de estado, a
democracia continua a funcionar mas o governo passa a ter poderes
inconstitucionais porque o maior partido da oposição deixa ter opinião e vota
tudo favoravelmente. Cavaco seguiu a sugestão de Manuela Ferreira Leite e exige
ao PS que aceite a suspensão temporária da democracia para fazer passar a refundação do Estado. Para o conseguir faz uma
comunicação dramática e propõe o golpe em público tentando atirar o povo contra
o PS.
Há quem defenda que a solução eram eleições autárquicas e
legislativas no mesmo dia. Puro engano, o que Portugal precisa é de mudar de
governo e de presidente tão depressa quanto possível, o que Portugal precisa é
de uma plataforma de gente honesta e com formação democrática para salvar o
país e a democracia. Há em Portugal um problema bem maior do que a incompetência de Passos Coelho, é a incompetência e os ódios pessoais de Cavaco Silva.