Um presidente que sabendo da crise profunda e do fim
eminente da coligação ignora um pedido de demissão do líder de um dos dois
partidos da coligação e dá posse a uma ministra cuja escolha é a causa da crise
só tem uma coisa a fazer, demitir-se.
Um presidente que ignora sistematicamente a Constituição da
República, reduzindo as competências da Presidência da República às do seu
vizinho da Junta de Freguesia de Belém e que quando está em dificuldades invoca
a Constituição para dizer que nada pode fazer, só tem uma coisa a fazer,
demitir-se.
Um presidente que por causa de odiozinhos pessoais dá
cobertura a conspirações contra a democracia, incita o descontentamento e faz
discursos incendiários e depois ignora o desastre político a que ajudou só tem
uma coisa a fazer, demitir-se.
Um presidente que deixa de ser presidente de todos os portugueses
e usa o dia 25 de Abril para atacar de forma inaceitável a oposições, como se
fosse o secretário-geral do partido do governo, só tem uma coisa a fazer,
demitir-se.
Passos Coelho pode fazer de conta que é primeiro-ministro
durante mais uns dias, mas Cavaco Silva já é um cadáver político, pode mesmo
dizer-se que desde que se fez reeleger que o é, só que a Constituição se
esqueceu de dizer como se enterram os cadáveres presidenciais quando estes se
recusam a ser enterrados.
Esta crise não é apenas uma crise política ou financeira, é
a crise de um modelo económico assente no oportunismo, da orientação de um país
segundo estratégias partidárias e de vaidades políticas pessoais, é o resultado
de um modelo de sociedade assente no oportunismo e na corrupção, é a crise do
cavaquismo em todo o seu esplendor.
Demitir Passos Coelho e manter Cavaco Silva é prolongar a
agonia de uma nação que teve o azar de ter sido governada na sua década mais
importante e presidida na fase mais complexa por um rural do barrocal algarvio,
alguém sem cultura, sem dimensão política, alguém que em má hora os portugueses
elegeram sucessivamente para primeiro-ministro e depois para Presidente da
República.
Demitir Passos Coelho equivale a tratar de uma gripe um
doente que sofre de cancro.